Em uma palestra nesta segunda-feira (8) na Corte de Cassação francesa, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, defendeu o papel das cortes constitucionais como guardiãs da democracia diante do avanço do populismo autoritário. Sua fala ocorre em meio ao julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e outros sete réus, que são acusados de tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022.
Democracia e o papel das cortes constitucionais
A apresentação de Barroso, realizada em francês, abordou o tema “Democracia e o papel das cortes constitucionais”, destacando os desafios que as instituições democráticas enfrentam no mundo contemporâneo. O ministro ressaltou que, embora os golpes militares clássicos tenham se tornado raros, a erosão democrática continua ocorrendo de maneira sutil, dentro do próprio sistema.
Barroso frisou que, apesar de as cortes constitucionais exercerem um papel essencial na proteção da Constituição e dos direitos fundamentais, elas não podem operar de forma isolada. “Os tribunais não são suficientes por si sós”, afirmou, ressaltando a importância do apoio de outras instituições democráticas para que as guarantias constitucionais sejam efetivas.
A comparação entre os modelos brasileiro e francês
Outro ponto abordado pelo presidente do STF foi a comparação entre os modelos brasileiros e franceses de controle de constitucionalidade. Barroso explicou que o Brasil utiliza um sistema misto, que combina controle concentrado e difuso, enquanto a França aplica o mecanismo da “question prioritaire de constitutionnalité” (QPC), que permite que questões de constitucionalidade sejam levantadas em casos concretos.
Durante sua apresentação, Barroso destacou também o cenário político brasileiro, caracterizado por tensões entre o populismo autoritário e as instituições democráticas. Ele explorou como essas tensões têm moldado o debate sobre a legitimidade e o papel das cortes constitucionais.
Apelo à preservação dos valores democráticos
Na conclusão de sua palestra, Barroso fez um apelo à preservação dos valores democráticos e ao fortalecimento das instituições. “Devemos cuidar da democracia, que é um bem precioso e, ao mesmo tempo, vulnerável”, afirmou, sublinhando a importância da vigilância constante para garantir o funcionamento adequado das instituições.
Nesta segunda-feira, em comentários sobre a análise da trama golpista, Barroso disse que o julgamento da ação penal ocorrerá “à luz do dia”, em contrapartida ao que aconteceu durante a ditadura militar, quando imperava um “mundo de sombras”. Ele enfatizou que, na ditadura, o devido processo legal não existia de forma pública e transparente, enquanto hoje a sociedade acompanha os desdobramentos do julgamento.
A realidade do julgamento e críticas políticas
“O que posso dizer é que, tendo vivido e combatido a ditadura, era naquele momento que não havia devido processo legal público e transparente”, disse Barroso. “O julgamento é um reflexo da realidade. Na vida, não adianta querer quebrar o espelho por não gostar da imagem”, completou.
As declarações de Barroso vêm em um contexto tenso, especialmente após o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), se referir a uma suposta “tirania” do ministro Alexandre de Moraes, do STF, e criticar a relação entre os poderes. Esse clima de confronto ressalta ainda mais a necessidade de diálogo e respeito às instituições, como salientou Barroso em sua palestra.
O papel das cortes constitucionais, então, emerge como um pilar fundamental para a manutenção da ordem democrática e a proteção dos direitos, especialmente em tempos de crescente polarização política. A reflexão trazida pelo presidente do STF é um convite à sociedade para que se mantenha atenta e ativa na defesa da democracia e de suas instituições.