A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) suspendeu temporariamente a tramitação de uma nova proposta que cria um plano de saúde focado apenas em consultas e exames. Avaliada pelas operadoras como uma iniciativa para ampliar o setor, a proposta ainda passa por análise de uma câmara técnica, que irá discutir seus aspectos e implicações, especialmente a ausência de cobertura para atendimentos de urgência e internação.
Plano de saúde restrito: vantagens e desafios
Apresentado em fevereiro pela própria ANS, o modelo simplificado visa oferecer uma alternativa de plano de saúde mais acessível e com menor custo, principalmente para consumidores que não possuem planos tradicionais. Segundo a agência, o público-alvo são pessoas que dependem do Sistema Único de Saúde (SUS), mas que utilizam serviços pagos em clínicas populares ou cartões de desconto.
A proposta é vista com entusiasmo pelas operadoras, que consideram a oportunidade de disputar espaço com os cartões de desconto e outros serviços. Sem regulação, nesse formato, o usuário paga mensalidade e garante descontos em consultas e exames laboratoriais. Ainda assim, há dúvidas quanto à sustentabilidade desse modelo e sua potencial sobrecarga no sistema público.
Impactos no mercado e na população
Estima-se que o universo de consumidores desse mercado seja entre 40 milhões e 60 milhões, segundo projeções da própria ANS e de estudos da pesquisa nacional. O cruzamento de dados aponta que 34% da Classe C dependem exclusivamente do SUS, enquanto 20% possuem algum tipo de plano de saúde e 46% recorrem ao setor privado de forma particular, fora das operadoras.
Cerca de Rudi Rocha, professor da FGV Eaesp e diretor do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (Ieps), alerta para o risco de sobrecarregar o SUS, especialmente suas unidades de média e alta complexidade. “A proposta pode aumentar a demanda por atendimentos mais sofisticados, já pressionados pelo sistema público”, afirma.
Convocação para discussão e possíveis caminhos
Segundo informações da reportagem, a ANS vai aguardar uma decisão final do Superior Tribunal de Justiça (STJ) antes de avançar com a análise do projeto, que também volta a ser discutido no âmbito do Judiciário. A iniciativa vem em meio a um crescimento das despesas com saúde privada no Brasil, que movimentaram R$ 578 bilhões em 2023, conforme dados da Associação Nacional dos Hospitais Privados (Anahp).
Especialistas avaliam que a ampliação do portfólio de produtos acessíveis é uma necessidade, principalmente para os trabalhadores formais e informais que atualmente não têm acesso a planos de saúde regulados. Segundo levantamento, 27,6 milhões de trabalhadores informais dependem exclusivamente do SUS, enquanto muitos empregadores ainda não oferecem planos de benefício.
Perspectivas futuras e debates em aberto
O debate sobre os planos restritos também envolve a utilização de parcerias público-privadas e a possibilidade de oferecer serviços ambulatoriais de forma mais acessível. Renato Meirelles, presidente do instituto Locomotiva, destaca que 76% dos entrevistados apoiam a formação de parcerias com o setor privado para ampliar o acesso e reduzir filas no SUS.
Por outro lado, a proposta ainda gera resistência por parte de setores que temem a precarização do atendimento e a exclusão de coberturas essenciais. A discussão deve avançar na Câmara Técnica da ANS, que avaliará os detalhes do projeto antes de qualquer decisão definitiva.