Na manhã de sexta-feira, a Polícia Federal deflagrou mais uma operação contra o desvio de emendas parlamentares. Os agentes apreenderam R$ 3,2 milhões em dinheiro vivo na casa de um ex-prefeito de Paratinga, no interior da Bahia. O município, com 30 mil habitantes e um dos piores índices educacionais do país, agora ganha destaque no noticiário nacional por causa de um escândalo de corrupção que abala as estruturas da política local e nacional.
Audiencia pública e críticas ao Congresso
Enquanto os policiais ainda contavam os maços de dinheiro encontrados num guarda-roupa, o Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou, em Brasília, uma audiência pública sobre as emendas. Os presidentes da Câmara e do Senado confirmaram presença, mas desistiram na última hora, evitando um constrangimento significativo. Durante mais de oito horas, economistas, pesquisadores e representantes da sociedade civil empilharam críticas ao Congresso pela farra orçamentária, onde a administração pública parece descontrolada e refém de interesses políticos.
Impacto da corrupção na governança
O procurador Roberto Livianu, do Instituto Não Aceito Corrupção, destacou a gravidade da situação, afirmando que “essa captura escandalosa do Orçamento não existe em lugar nenhum do planeta”. Ele enfatizou que o avanço do legislativo sobre os cofres públicos viola a responsabilidade fiscal e deturpa as bases do regime presidencialista. Livianu pontuou ainda que o Congresso tem mudado as regras do jogo, legislando para si e violando o princípio constitucional da separação dos Poderes. A situação, segundo ele, cria um cenário de ineficiência e desconfiança que consome os recursos públicos sem transparência adequada.
Emendas em questão
Felipe Salto, ex-secretário da Fazenda de São Paulo, apresentou dados alarmantes: o valor destinado através das emendas parlamentares disparou 700% em apenas oito anos. Em 2025, cada deputado poderá destinar R$ 37,3 milhões como quiser, enquanto cada senador terá à disposição R$ 68,5 milhões. “As emendas, no patamar que estão, prejudicam a sustentabilidade fiscal e impedem o Executivo de exercer sua função, que é cuidar do Orçamento”, alertou Salto, demonstrando preocupação com a gestão fiscal do país.
A opacidade das emendas e suas consequências
A cientista política Juliana Sakai, da Transparência Brasil, definiu o quadro atual como “catastrófico”. Ela lembrou que as decisões do Supremo para normatizar a liberação das emendas têm sido “constantemente dribladas” pelos parlamentares, criando um ciclo vicioso que beneficia poucos em detrimento do bem coletivo. “O Legislativo é beneficiário da opacidade das emendas parlamentares e não esconde seu incômodo com medidas de controle”, afirmou, destacando a necessidade urgente de reforma e maior supervisão nas atribuições orçamentárias dos parlamentares.
A luta pelo controle orçamentário
Durante a audiência, houve confrontos diretos entre deputados e senadores, que acusaram o governo de agir em conluio com o ministro Flávio Dino, relator das ações que questionam a legalidade das emendas. Dino ressaltou que suas decisões foram referendadas por ministros indicados por cinco presidentes, afirmando: “Não estamos tratando de um tema de interesse de um governo. Há interesse dos governos, os pretéritos e os futuros”, sinalizando a complexidade da interação entre os Poderes na gestão dos recursos públicos.
Visões divergentes sobre a utilização das emendas
As palavras de Dino foram corroboradas pelo governador de Mato Grosso, Mauro Mendes, que, alinhado ao grupo ruralista e ao ex-presidente Jair Bolsonaro, definiu o inchaço das emendas como uma “anomalia”. Mendes afirmou que “as emendas hoje servem mais como instrumento de gestão política e de interesses eleitorais do que de interesses maiores da sociedade”, resumindo a crítica popular sobre como os recursos estão sendo alocados e a dificuldade em trazê-los de volta para projetos que efetivamente beneficiem a população.
Essa discussão intensa veio à tona em um momento em que o País passa por uma profunda reflexão sobre a relevância e a transparência na aplicação dos recursos públicos. Na ausência de figuras-chave como Hugo Motta e Davi Alcolumbre, advogados da Câmara e do Senado tentaram defender o sistema atual. Contudo, após pressionar o governo para liberar R$ 1,15 bilhão aos parlamentares, o Congresso derrubou um importante decreto sobre o IOF, colocando em evidência novamente a força dos parlamentares na cena política.
Com tantos acontecimentos, fica claro que o Brasil ainda enfrenta um longo caminho pela frente em sua luta contra a corrupção e por uma gestão pública mais eficiente e transparente.