Diante de derrotas consecutivas no Congresso, a Secretaria de Relações Institucionais (SRI), sob a liderança da ministra Gleisi Hoffmann, iniciou um pente-fino nos cargos indicados por aliados. Esta estratégia do núcleo de articulação política do governo visa assegurar maior lealdade dos parlamentares, embora seja considerada uma manobra sensível no Palácio do Planalto. A necessidade de tal revisão se intensificou em um cenário político complicado, onde a sustentação da base aliada se mostra cada vez mais desafiadora.
A fragilidade da base parlamentar
Os auxiliares do presidente Lula, envolvidos nas articulações, reconhecem que retirar uma indicação de um aliado não é tarefa simples. Para evitar novas fissuras na já fragilizada base parlamentar, o governo busca minimizar mudanças, conduzir diálogos com os líderes dos partidos e evitar disputas internas entre os deputados. Ao mesmo tempo, a administração tenta equilibrar novas adesões com eventuais alterações nas indicações, diante de uma pressão crescente por cargos.
Uma análise feita por técnicos envolvidos no levantamento revela que 50% das indicações em cargos nos estados ainda pertencem a nomes escolhidos durante o governo anterior, de Jair Bolsonaro. Essas vagas estão majoritariamente vinculadas a partidos que apoiaram a gestão do ex-presidente, mas que, em parte, agora atuam sob a liderança de Lula. A outra metade dessas indicações foi feita no primeiro ano da atual gestão, quando a SRI era liderada por Alexandre Padilha. A percepção é clara: os acordos feitos no início do governo parecem estar desatualizados frente à atual dinâmica do Congresso.
Questões regionais e compromissos não cumpridos
Adicionalmente, há um diagnóstico que aponta que, em alguns estados, os indicados nos cargos no começo do governo hoje se mostram mais próximos de governadores da oposição. Para complicar ainda mais, muitos dos parlamentares assumiram compromissos que não estão sendo honrados, como apoiar o governo em 50% das votações. Na prática, cada deputado teoricamente da base pode nomear cerca de dez postos em órgãos como a Secretaria de Patrimônio da União (SPU) e o DNIT, entre outros.
O estopim: projeto de anistia
A recente adesão ao pedido de urgência do projeto de anistia disparou a necessidade do pente-fino nas indicações. Das 264 assinaturas coletadas, 146 pertencem a parlamentares de partidos que fazem parte da base do governo, evidenciando a fragilidade do apoio ao Planalto. O projeto, que não avançou até o presente momento, enfrenta a forte oposição do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), que, por sua vez, reforça a precariedade da relação entre a Câmara e o governo.
Um exemplo claro dessa tensão é o caso do deputado Eduardo da Fonte (PP-PE). Ele indicou a superintendente da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) para o cargo, mas mesmo assim apoiou o projeto da anistia. A CBTU, ligada ao Ministério das Cidades, enfrenta agora um dilema, já que ambas as figuras — Eduardo da Fonte e seu filho — manifestaram apoio a iniciativas que vão contra o governo que os indicou.
Riscos de mudança e a importância das emendas parlamentares
Outro sinal de alerta se acendeu com a coleta de assinaturas para abertura de uma CPI na Câmara e uma CPMI no Congresso, relacionadas a descontos indevidos no INSS, onde muitos parlamentares de partidos da base também assinaram. Isso levantou questões sobre como a lealdade política é percebida atualmente em Brasília. Auxiliares de Lula expressam que a indicação de cargos tem valor político reduzido em comparação ao passado. Nesse atual cenário, as emendas parlamentares que direcionam recursos para obras nas bases eleitorais vão se tornando mais representativas.
No entanto, um desafio importante permanece: os parlamentares que demonstram maior fidelidade ao governo reivindicam maiores espaços de representantes nas decisões. Em uma análise preliminar, a diferença é clara; parlamentares com altos índices de lealdade ao governo lotam cargos com uma interação nas votações, enquanto outros demonstram suporte em menos de 15% dos casos. Esse descompasso mostra que o Partido dos Trabalhadores (PT) é o mais insatisfeito com as indicações que não garantem apoio. O descontentamento é evidente nas superintendências dos Correios, onde sete delas estão em posse do União, enquanto os petistas tentam fortalecer posições para seus aliados.
Conforme o governo navega neste mar turbulento, a análise política se torna cada vez mais complexa. O desafio de manter a governabilidade em meio a variadas pressões é um tema recorrente nas discussões de Brasília, e o desenrolar dessa história ainda promete surpresas para os próximos dias.