A cachaça caiçara é uma bebida que não apenas representa a tradição, mas também a inovação e a riqueza da biodiversidade brasileira. Produzida com a infusão da folha da planta Pimenta pseudocaryophyllus, popularmente conhecida como cataia, esta bebida tem se destacado como uma atração turística na região litorânea de São Paulo. Ao mesmo tempo, a cataia é uma planta com amplas propriedades medicinais, que merecem ser exploradas e valorizadas.
A história da cachaça caiçara
Localizada em Cananéia, no litoral paulista, a Cachaçaria Artesanal JRios tem mais de 70 anos de história, sendo fundada pelo pai de Perla Rios, que assumiu o negócio há 16 anos. Desde então, Perla tem buscado inovar, levando a cachaça a novos patamares com a inclusão da cataia em seus processos de produção. Segundo Perla, o uso da folha proporciona um aroma e sabor únicos, que diferenciam sua cachaça das demais disponíveis no mercado.
Da planta à bebida: o processo de saborização
O sabor da cachaça caiçara é resultado de um processo cuidadoso de infusão da cataia. Perla utiliza a folha da planta para ‘saborizar’ não apenas a cachaça, mas também outros produtos alimentícios como brigadeiros, brownies e azeites. Segundo ela, a folha da cataia muda completamente o perfil de sabor, oferecendo uma experiência sensorial envolvente. “A cataia, na bebida, fica algo muito diferente. Você tem que ter um paladar mais aguçado para apreciar”, disse Perla.
O que é a cataia e suas propriedades
A cataia é uma espécie nativa do Brasil, encontrada principalmente na Mata Atlântica e no Cerrado, abrangendo uma vasta área que vai do Rio Grande do Sul até a Bahia. De acordo com o biólogo João Vicente Coffani Nunes, a planta é reconhecida não só por seu potencial na culinária, mas também por suas propriedades medicinais. Popularmente empregada para tratar problemas estomacais e respiratórios, a cataia destaca-se por ter eugenol, um composto antisséptico muitas vezes utilizado em odontologia.
Revalorização da cataia em regiões do Brasil
Embora a cataia seja amplamente utilizada no sul de São Paulo, muitas regiões ainda desconhecem seus benefícios. Nunes enfatiza que a planta possui uma importância cultural que vai além do uso medicinal, sendo parte da história e da identidade de suas comunidades. “Nas outras regiões do Brasil em que ela ocorre naturalmente, as pessoas não conhecem esse valor medicinal dela e de lazer”, comenta. Neste sentido, a cachaça caiçara se torna uma ponte entre a tradição e a modernidade, levando o sabor da cataia para novos públicos.
Desafios e cuidados com o extrativismo
O extrativismo é a principal forma de obtenção da cataia, e Nunes alerta para a necessidade de práticas sustentáveis. “Teve uma vez que eu encontrei o pé de cataia cortado, porque arrancaram as folhas dela. Você pode cortar alguns galhos e arrancar a folha, não precisa cortar a árvore”, explica. A conscientização sobre a preservação da planta é fundamental, já que a demanda crescente pode colocar a espécie em risco.
Uso consciente e sustentável da cataia
A Cachaçaria Artesanal JRios segue rigorosos padrões de higiene e preservação no manejo da cataia. Perla utiliza lenços umedecidos com álcool para limpar as folhas, evitando lavá-las, e mantém uma estufa para armazená-las adequadamente. “Ela dá para uma diversidade absurda de produtos. É que ela só não tinha sido explorada”, conclui. A responsabilidade no uso da cataia deve ser uma prioridade para garantir a continuidade de seu legado e a saúde dos biomas onde ela habita.
Por meio da combinação de tradição e inovação, a cachaça caiçara não só promove a cultura local, como também evidencia a importância das plantas nativas na gastronomia e medicina popular. A cataia é, sem dúvida, uma joia da biodiversidade brasileira que merece ser celebrada e preservada.