O Supremo Tribunal Federal (STF) volta a se debruçar sobre uma questão crucial para o uso da internet no Brasil: a responsabilização das plataformas digitais por conteúdos publicados por usuários. Na última quinta-feira, o ministro André Mendonça abriu divergência ao votar a favor da constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, posicionando-se contra a remoção de perfis que não sejam falsos.
O voto divergente de Mendonça
Durante a sessão, Mendonça defendeu que as plataformas, que incluem mecanismos de busca e marketplaces, devem promover a identificação do usuário que violar direitos de terceiros, mas que o responsável direto pela conduta ofensiva deve ser acionado judicialmente. “É inconstitucional a remoção ou a suspensão de perfis de usuários, exceto quando comprovadamente falsos”, destacou o ministro, sustentando que essa decisão deve ser respaldada por um processo legal adequado.
O julgamento foi suspenso após o voto de Mendonça e ainda não há uma nova data para sua retomada. O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, enfatizou que a pauta será definida por ele, com a elaboração de uma tabela comparativa dos votos já proferidos.
A discussão sobre a responsabilidade das plataformas
A discussão em torno da constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet é complexa. Recentemente, três ministros já havia votado pela inconstitucionalidade da norma. Dias Toffoli, Luiz Fux e Luís Roberto Barroso sustentaram que o artigo falha em garantir proteção efetiva aos direitos fundamentais e que as plataformas devem agir proativamente quando recebam notificações de conteúdos ofensivos ou ilícitos.
Toffoli, por exemplo, mencionou que as plataformas devem agir após receber notificações extrajudiciais, sem a necessidade de esperar por uma decisão judicial. Isso se aplica especialmente a conteúdos como racismo, que configuram crimes previstos em lei. “Parece evidente que, com a atual redação do artigo 19, temos uma ‘terra sem lei’”, criticou Fux, referindo-se à falta de responsabilidade e estímulo para que as plataformas removam conteúdos ilícitos.
O papel do Legislativo
Em seu voto, Mendonça ressaltou que a regulação das plataformas digitais deve ser uma competência do Legislativo e não do Judiciário. Ele argumentou que apenas os representantes eleitos pelo povo têm a legitimidade para estabelecer regras sobre o uso da internet, assegurando a liberdade de expressão tanto online quanto offline. “Ninguém melhor do que os diretamente investidos da legitimidade democrática para estabelecer as regras de utilização da ‘ágora’ do nosso tempo”, afirmou.
O que está em jogo, portanto, não é apenas a responsabilidade das plataformas, mas também a preservação do direito à expressão e a forma como a legislação se aplica nesse novo cenário digital. Este julgamento é um passo importante na direção de definir como as redes sociais devem lidar com conteúdos problemáticos, sempre buscando um equilíbrio entre liberdade de expressão e proteção dos direitos dos cidadãos.
Possíveis impactos do julgamento
O resultado desse julgamento poderá ter um impacto direto no modo como as plataformas operam no Brasil. Atualmente, segundo a legislação vigente, as redes sociais só são responsabilizadas se descumprirem uma ordem judicial para remoção de conteúdo. Isso implica que, enquanto a norma não for revista, as plataformas têm um nível considerável de proteção em relação ao que os usuários publicam.
Se a decisão do STF for pela inconstitucionalidade do artigo 19, as plataformas poderão ser compelidas a agir de forma mais vigilante e proativa em relação ao conteúdo postado por seus usuários, o que poderia levar a uma mudança significativa nas operações diárias das redes sociais e em sua responsabilidade legal.
Contudo, esta questão ainda está longe de ser resolvida. Com a divergência já apresentada e a necessidade de mais deliberação no tribunal, a dúvida persiste em relação ao futuro das políticas de moderação de conteúdo na internet brasileira.
O STF espera que o Congresso avance sobre a criação de um novo marco regulatório para este tema, mas as discussões até agora têm enfrentado obstáculos, como demonstrado pela tramitação atrasada do PL das Redes Sociais.
Assim, fica a expectativa de que a corte se pronuncie de forma definitiva sobre essa matéria, que é fundamental para a interação social no ambiente digital e para a proteção dos direitos fundamentais na era da informação.