O julgamento sobre a responsabilização das plataformas digitais no Supremo Tribunal Federal (STF) voltou a ganhar destaque nesta quarta-feira, com a apresentação do voto do ministro André Mendonça. O ministro, que havia solicitado vista do caso anteriormente, expressou sua divergência em relação aos votos já proferidos, apontando a prerrogativa do Congresso Nacional em legislar sobre as regras do Marco Civil da Internet.
André Mendonça e o papel do Legislativo
Ao iniciar seu voto, Mendonça fez uma análise detalhada sobre o fenômeno das redes sociais e o impacto das fake news. Ele argumentou que a temática é de competência do Legislativo e que o Poder Judiciário, ao atuar de forma preponderante em questões que deveriam ser discutidas pelo Congresso, contribui para aumentar a desconfiança da população nas instituições. “Ao assumir maior protagonismo em questões que deveriam ser objeto de deliberação por parte do Congresso Nacional, o Poder Judiciário acaba contribuindo, ainda que não intencionalmente, para a agudização da sensação de desconfiança hoje verificada em parcela significativa da nossa sociedade”, afirmou Mendonça.
No decorrer de seu voto, o ministro enfatizou a importância da liberdade de expressão, defendendo uma abordagem que prioriza esse princípio fundamental. “Por tudo quanto se apontou especificamente em relação ao fenômeno das fake news, diante da sua íntima conexão com os processos de crise institucional e democrática, se torna ainda mais imperiosa a adoção de uma postura autocontida”, acrescentou.
Crises institucionais e fake news
Mendonça enfatizou que é crucial considerar o cenário atual, no qual muitos cidadãos expressam desconfiança sobre a credibilidade das instituições. Ele questionou a eficácia de medidas que, mesmo com a justificativa de combater a desinformação, poderiam limitar a capacidade das pessoas de expressar seu descontentamento com o governo. “Não me parece que seja adotando medidas que, em última análise, irão impedi-lo de manifestar seu descontentamento com o estado de coisas vivenciado – inclusive por meio da defesa de outros regimes de governo, em substituição à forma democrática”, ponderou.
O debate no STF não ocorre em um vácuo. Na mesma sessão, o ministro Luis Roberto Barroso, relator do processo, havia afirmado que a análise não configuraria “censura” nem “invasão” à competência de outros poderes. Após as falas de Mendonça, a sessão foi suspensa e será retomada na quinta-feira, onde o ministro deverá continuar sua análise.
Responsabilização das plataformas digitais
O cerne do julgamento reside na responsabilização das plataformas pelos conteúdos gerados por terceiros. Atualmente, a legislação vigente estipula que as redes sociais só podem ser responsabilizadas caso desrespeitem uma ordem judicial para remover conteúdo. No entanto, os votos de outros dois relatores, Fux e Toffoli, indicam uma mudança nesse cenário. Ambos consideram o artigo 19 do Marco Civil da Internet inconstitucional e defendem que as plataformas devem agir imediatamente a partir de notificações extrajudiciais. Para eles, esse novo modelo é necessário para garantir proteção efetiva aos direitos fundamentais no ambiente digital.
Pressões externas sobre o STF
O julgamento ocorre em um contexto delicado, com pressões externas, como as ameaças do governo dos Estados Unidos, que podem interferir nas decisões do STF. O governo de Donald Trump mencionou a possibilidade de sanções ao ministro Alexandre de Moraes devido a suas decisões contra grandes empresas de tecnologia. Além disso, observa-se que o bilionário Elon Musk também pode estar influenciando essas dinâmicas.
Diante de todo esse cenário, o STF busca reafirmar sua autonomia e a importância de decidir sobre a responsabilização das plataformas digitais. É um momento crítico que pode redefinir as regras do jogo na internet no Brasil. O julgamento não apenas aborda questões jurídicas, mas também toca em questões sociais, políticas e a crise de confiança nas instituições que permeia a sociedade atual. Com sete ministros ainda a votar e a possibilidade de pedidos de vista, o desdobramento desse julgamento pode ter consequências de longo alcance, moldando a forma como a internet é regulamentada no país.
O Supremo Tribunal Federal ainda não se manifestou sobre o impacto das decisões que planeja tomar. O debate continua enquanto o Brasil aguarda uma solução que balanceie a responsabilidade das plataformas com a proteção dos direitos fundamentais dos cidadãos.