O grupo Novonor, antigo Odebrecht, divulgou uma nota no último sábado que expressa seu compromisso com o acordo de colaboração firmado com o Estado peruano. Esse acordo é representado pelo Ministério Público e pela Procuradoria Pública do país. No entanto, a empresa levantou preocupações em relação a “reiterados descumprimentos” por parte das autoridades peruanas. De acordo com a Novonor, esses descumprimentos afetam os termos do compromisso que proíbem a utilização de provas obtidas em um acordo com o Brasil contra a empresa.
A relação conturbada entre Brasil e Peru
A manifestação da Novonor surge em um contexto delicado, especialmente após o GLOBO noticiar que a Secretaria Nacional de Justiça, vinculada ao Ministério da Justiça do Brasil, suspendeu acordos de cooperação jurídica com as autoridades peruanas. Essa decisão tem como pano de fundo a utilização de provas que, segundo o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), foram consideradas inválidas no ano passado. Tal movimento propaga a ideia de que não há a devida proteção prevista para a Novonor, o que coloca em xeque todo o processo de troca de informações entre os dois países.
Além disso, a Procuradoria-Geral da República (PGR) brasileira também decidiu suspender atos de cooperação com o Peru, alinhando-se à mesma justificativa já apresentada pela Secretaria Nacional de Justiça. A Novonor argumenta que as suspensões têm um caráter técnico e jurídico e não político, desmentindo assim acusações de que existam interesses maiores por trás das decisões.
Irregularidades e questões legais
Na nota divulgada, a Novonor apontou irregularidades cometidas pelas autoridades peruanas, como tentativas de expropriação de ativos da empresa com base em informações que correram no âmbito do acordo de leniência firmado com o Ministério Público Federal (MPF) e autoridades dos Estados Unidos. Esse ponto é crucial, uma vez que, conforme a empresa, essas informações não deveriam ser utilizadas para processos no Peru.
Além disso, a Novonor destacou que o tratado de assistência judicial entre Brasil e Peru contém garantias que impossibilitam o uso de provas fornecidas pela companhia contra ela mesma. Os termos do acordo estipulam que as fontes e meios de prova, entregues voluntariamente pela Novonor, não podem ser utilizados em processos penais, cíveis ou administrativos, um aspecto que, de acordo com a empresa, vem sendo ignorado.
A disputa de arbitragem e seus desdobramentos
Um dos elementos centrais do discurso da Novonor está ligado a um processo de arbitragem que a empresa move contra o governo peruano em Londres. Nessa disputa, a Novonor busca uma indenização de cerca de US$ 1 bilhão, equivalente a aproximadamente R$ 5,68 bilhões, em razão de investimentos realizados no Gasoduto Sur Peruano, obras que foram interrompidas sem conclusão. A empresa alega que os ativos foram expropriados pelo governo em 2017 sem a devida compensação.
O caso se torna ainda mais tenso à medida que a Novonor alega que informações obtidas por promotores e procuradores peruanos a partir da colaboração com as autoridades brasileiras foram indevidamente utilizadas na referida arbitragem. Revelações obtidas, por exemplo, através da delação do ex-diretor da Odebrecht, Jorge Barata, incluíam o pagamento de propinas e práticas de caixa 2 relacionadas a campanhas políticas no Peru.
Compromissos não cumpridos e futuro incerto
O histórico de descumprimentos nos acordos de cooperação já havia alarmado a Novonor, que mencionou uma suspensão anterior da cooperação em 2022, resultante de queixas semelhantes sobre as ações das autoridades peruanas. Após essa suspensão, houve uma ata de entendimento entre a empresa e o Ministério Público do Peru, que afirmava um compromisso em corrigir os descumprimentos identificados. Contudo, a Novonor relata que, logo após o restabelecimento da cooperação, novas irregularidades foram observadas, levando à atual suspensão.
Em suma, o futuro da atuação da Novonor no Peru, assim como a continuidade de sua relação com as autoridades brasileiras, permanece incerto. Com a escalada das tensões e a contestação sobre a validade das provas e a colaboração bilateral, a empresa se vê em um impasse que poderá influenciar não apenas sua recuperação judicial, como também o cenário jurídico entre os dois países.