Um recente levantamento realizado pelo jornal O GLOBO revelou que, mesmo diante de orçamentos estaduais muitas vezes fragilizados, deputados estaduais têm recebido remunerações mensais que superam o teto constitucional em pelo menos 17 unidades da federação. O teto legal é estipulado em R$ 34,7 mil, que corresponde a 75% do salário de um deputado federal. No entanto, muitos parlamentares têm visto seus contracheques ultrapassarem esta quantia, conforme os dados coletados nos portais de transparência entre janeiro e março deste ano.
Valores exorbitantes em diversas assembleias
De acordo com a análise, a remuneração bruta média dos deputados estaduais foi de R$ 46,5 mil no primeiro trimestre de 2025. Em nove estados, esse valor supera os R$ 50 mil. No Rio Grande do Norte, por exemplo, os salários médios podem alcançar impressionantes R$ 66 mil, devido às chamadas “vantagens pessoais”, cujos detalhes de composição não são tornados claros. A Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte não respondeu aos questionamentos sobre a origem desses valores.
A falta de transparência incide também em estados como Rondônia, onde os contracheques incluem auxílios não discriminados que, juntos, ultrapassam R$ 33 mil além do salário-base. Essa prática levanta sérias questões sobre a clareza e a ética das remunerações públicas em um momento em que muitos estados enfrentam crises fiscais.
Composição das remunerações
As remunerações dos deputados estaduais são compostas por um salário-base, que varia de R$ 25 mil a R$ 34 mil, dependendo do estado, a que se somam diversas verbas adicionais, muitas vezes classificadas como indenizatórias. Entre os adicionais mais frequentes estão auxílio-saúde, auxílio-alimentação com valores que superam a média do mercado e gratificações que vão de R$ 6 mil a R$ 17 mil. Por exemplo, em Pernambuco, o vale-refeição mensal dos deputados é de R$ 3,4 mil. Além disso, a maioria das Assembleias ainda concede o denominado “auxílio-paletó”, pago no início e no final do mandato, com um valor equivalente a um salário mensal, podendo ser acumulado em caso de reeleição.
O respaldo jurídico das remunerações
Embora esses pagamentos extrapolem o teto constitucional, eles são respaldados juridicamente. O Supremo Tribunal Federal (STF) e tribunais de contas entendem que o limite de R$ 34,7 mil se aplica apenas às parcelas de caráter remuneratório. Conforme o ministro André Mendonça, as parcelas de natureza indenizatória estão isentas desse teto, permitindo a autorização dos chamados “supersalários”. Esta questão levanta um debate entre especialistas em Direito Público e Administração Pública, que apontam que tal interpretação é uma brecha que enfraquece o teto remuneratório estabelecido pela Constituição.
O jurista Edgard Monteiro critica essa prática, afirmando que se criam “supersalários” com gratificações que os parlamentares alegam ter natureza indenizatória, e que muitas vezes são justificados por funçõe especiais ou comissões extras, contornando assim o teto constitucional.
A resposta das Assembleias
Em respostas às críticas, as assembleias têm reafirmado que suas práticas estão dentro da legalidade estipulada pela Constituição. A Câmara Legislativa do Distrito Federal, por exemplo, afirmou que os auxílios têm caráter indenizatório e não integram o subsídio mensal, portanto, não são contabilizados dentro do teto remuneratório. Posicionamentos semelhantes foram expressados por outros legislativos, como os de Pernambuco, Espírito Santo e Tocantins.
Contudo, não existem propostas nas Assembleias que visem conter os chamados “penduricalhos”. Pelo contrário, novos projetos criando auxílios adicionais tramitam rapidamente e, frequentemente, são aprovados por unanimidade. Em Minas Gerais, por exemplo, a Assembleia Legislativa aprovou um aumento de 78% no teto do auxílio-moradia, elevando o valor para R$ 8,6 mil em 2025. Outros estados, como Goiás e Mato Grosso, também aprovaram gratificações extras por “representação”, que são destinadas a membros da mesa diretora e líderes de bancada, cargos geralmente ocupados pela maioria dos parlamentares.
Esse cenário evidencia a persistente luta contra as desigualdades no Brasil, onde os supersalários prevalecem em meio a sérias crises fiscais. Juristas como Rafael Paiva alertam que, em estados endividados como Minas Gerais e Goiás, os parlamentares continuam a acumular benesses financeiras que, aparentemente, fogem do controle do teto constitucional.
À medida que essa situação evolui, a fiscalização e o escrutínio das práticas de remuneração dos deputados estaduais continuam a ser vitais, pois a sociedade clama por transparência e responsabilidade no uso de recursos públicos.