Brasil, 22 de dezembro de 2025
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Festas de Natal nas igrejas americanas enfrentam medo e vigilância

Neste Natal, a Igreja Episcopal de São Mateus, localizada em Hyattsville, Maryland, vive uma situação sem precedentes. As posadas, uma tradição latino-americana que recria a busca de Maria e José por um abrigo antes do nascimento de Jesus, não serão realizadas ao ar livre, como de costume. O evento, que inclui comida e cantos num ambiente festivo, será realizado dentro das casas pela primeira vez, longe dos olhares dos transeuntes.

“Vamos celebrá-las dentro de nossas casas; não podemos fazer nada ao ar livre”, lamenta o Padre Vidal Rivas. Isto se deve à presença de agentes da Imigração e Controle de Alfândegas (ICE), que atuam na vizinhança, conhecida por abrigar uma grande população de imigrantes hispânicos. As operações da ICE e a possibilidade de uma batida já têm deixado suas marcas.

Rivas tem presenciado os efeitos devastadores da campanha anti-imigração da administração Trump sobre seus paroquianos. “As pessoas ainda têm muito medo, e em uma semana, 13 membros da nossa igreja se auto-deportaram”, conta. Três outros foram deportados por autoridades federais e vários estão detidos em instalações da ICE.

Com a nova regra de se abster de quaisquer atividades ao ar livre, a tradicional procissão de Nossa Senhora de Guadalupe — que deveria ter ocorrido em 10 de dezembro — foi cancelada. Apenas 60 pessoas participaram da missa da Imaculada Conceição na segunda-feira, metade do esperado por Rivas. “As celebrações de Natal costumavam ser alegres e com maior participação. Agora, somente cerca de 40% das pessoas que costumavam vir estão participando.”

Até Donald Trump retornar à Casa Branca em janeiro, as igrejas, assim como hospitais e escolas, eram consideradas “locais sensíveis”, protegidos de ações de imigração. Contudo, ao assumir o cargo, o republicano revogou essa proteção, garantindo que não houvesse como escapar da vigilância da ICE. Desde então, sempre que o Padre Rivas celebra a Missa, voluntários — cidadãos americanos — ficam no estacionamento e fora da igreja, monitorando a área e alertando os paroquianos se uma batida estiver iminente.

O impacto do medo nas celebrações religiosas

“A véspera de Natal e o dia de Natal são datas muito importantes, feriados em que as pessoas vão aos templos,” afirma o bispo Dwayne Royster, diretor executivo da Faith in Action, uma rede com mais de 1.000 congregações de diferentes crenças em todo os EUA. “Muitas pessoas estão preocupadas com esta época do ano e se conseguirão frequentar suas igrejas com segurança.”

Royster observa que este ano muitas pessoas optarão por seguir os serviços virtualmente, onde essa opção for oferecida. No entanto, a falta da atmosfera comunitária que uma igreja física proporciona desanima muitos. O Padre Rivas tentou oferecer aulas de catecismo e até Missas online, mas quase ninguém participou. “Se continuássemos a realizar as Missas online, iríamos à falência”, ele afirma.

As igrejas estão buscando maneiras de se proteger das invasões da ICE. Em alguns casos, a vigilância é feita do lado de fora; em outros, os paroquianos trocam turnos para ficar de guarda, observando janelas durante os serviços. Alguns incentivam a presença de cidadãos americanos para que a diversificação racial dos participantes não se torne tão evidente. “É incrível a fé que as pessoas têm, porque agora a decisão de ir à igreja é de alto risco, não apenas como imigrante, mas como latino,” diz o pastor Julio Hernández, que lidera a Rede de Ação Congregacional, que organiza igrejas católicas e protestantes na área de Washington, D.C., Maryland e Virginia.

Hernández aponta que “a ameaça [de prisões] é sentida de forma muito forte. Isso não afeta apenas o clima das celebrações de Natal, mas também a pobreza, pois os empregos estão diminuindo.” Ele menciona o caso de uma mãe solteira que costumava trabalhar em tempo integral em um restaurante, mas agora teve suas horas cortadas pela metade porque “as pessoas não estão saindo para comer.” A comunidade tem menos recursos para celebrar.

A ofensiva de imigração da administração Trump gerou críticas severas de comunidades religiosas. O Papa Leão XIV, a Conferência dos Bispos Católicos dos EUA, e clérigos de várias tradições religiosas têm se manifestado contra a agenda de imigração do governo. Várias igrejas fizeram protestos através dos presépios que costumam expor nesta época do ano.

Presépios com mensagens de protesto

Um desses presépios apareceu em uma igreja em Optimist Park, Charlotte, Carolina do Norte — onde Trump enviou a patrulha de fronteira no mês passado para aumentar as detenções de imigrantes. No display, agentes da imigração mascarados e com coletes à prova de balas misturam-se entre as figuras de Jesus, Maria e José. O pastor da igreja comentou que o objetivo era refletir o medo que muitas famílias migrantes enfrentam após detenções recentes. “O objetivo é perturbar, fazer as pessoas sentirem algo,” disse o reverendo Andrew Shipley.

Outra cena provocativa está em exibição na Igreja Batist Lake Street em Evanston, Illinois, onde Maria e José estão representados usando máscaras de gás. O reverendo Michael Woolf explica que a cena foi intencionada para chamar a atenção para o gás lacrimogêneo usado pelos agentes de imigração contra manifestantes em Chicago.

As semelhanças entre a história bíblica do nascimento de Jesus de Nazaré e a realidade dos migrantes nos EUA serão enfatizadas em muitos sermões neste Natal. “Quando pensamos na história de um bebê que nasceu e, com o tempo, teve que fugir de seu país de origem por razões de segurança, isso é uma história familiar para muitos de nossos irmãos e irmãs imigrantes em todo o país,” reflete Royster. “E, mesmo agora, eles se sentem ameaçados no lugar que deveria ser seu refúgio, temendo tortura, detenção ou deportação neste país, que deveria ser o lugar onde encontraram segurança.”

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