A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, confirmou que o julgamento do homem negro morto durante abordagem de funcionários de supermercado em Porto Alegre deve incluir a motivação racial como elemento a ser analisado pelos jurados. A decisão ocorreu nesta sexta-feira (17) e reforça o entendimento de que questões de racismo podem ser submetidas ao tribunal do júri, mesmo sem provas explícitas na fase preliminar do processo.
STJ amplia competência do júri na análise de motivação racial
O relator, ministro Sebastião Reis Júnior, destacou que a definição sobre a presença ou não de motivação racial no crime deve ficar a cargo do conselho de sentença. Segundo o ministro, a fase de pronúncia não deve aprofundar-se na avaliação do mérito, mas sim verificar se há elementos mínimos que justifiquem levar o caso a julgamento pelo júri popular.
“A decisão de excluir a qualificadora de motivo torpe, que inclui o racial, invade a competência do júri, pois a análise aprofundada do mérito cabe aos jurados, que têm a atribuição de ponderar o conjunto probatório”, afirmou o ministro em seu voto.
Reversão de decisão e importância do contexto social
O recurso do Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS) questionava decisão do Tribunal de Justiça local, que havia excluído a motivação racial na fase de pronúncia. A Justiça gaúcha argumentou que não havia provas concretas de que a violência fosse motivada por racismo, apontando a ausência de relatos de ofensas explícitas ou testemunhos diretos de discriminação racial.
Ao analisar o recurso, Sebastião Reis Júnior afastou esse entendimento e afirmou que, na fase de pronúncia, a avaliação do mérito, especialmente em casos de racismo estrutural, deve ser reservada ao julgamento pelo júri. “A ausência de provas explícitas não impede a consideração, em tese, de motivação por racismo, uma prática que muitas vezes se manifesta por modos e práticas discriminatórias”, explicou.
Racismo além de palavras: práticas estruturais em foco
O ministro reforçou que o racismo não precisa se manifestar apenas por meios diretos, como palavras ou gestos, mas também por ações estruturais, como abordagens abusivas, vigilância desproporcional ou uso excessivo de força, que atingem principalmente pessoas negras e vulneráveis socialmente.
Ele destacou que a condição racial da vítima, monitorada de forma intensa e submetida a uma contenção violenta, indica uma possível motivação de preconceitos arraigados na estrutura social e institucional. Tal elemento, segundo o relator, é suficiente para deixar essa questão sob análise do júri, sem necessidade de comprovação definitiva nesta fase processual.
O depoimento da delegada responsável pelo inquérito, que apontou a influência de estigmas sociais e raciais na abordagem, também foi citado como prova relevante para o entendimento do caso.
O número do processo não foi divulgado devido ao segredo de justiça.
Para mais informações, acesse a fonte oficial do STJ.


