A história de Maceió, Alagoas, tornou-se um triste exemplo de desastres ambientais, deixando uma marca indelével na vida de cerca de 60 mil pessoas forçadas a deixar suas residências por conta do afundamento do solo. Igrejas, escolas e hospitais encerraram suas atividades devido ao problema, resultando em bairros fantasmas que se tornaram uma realidade para seus antigos moradores. Uma imagem que simboliza essa tragédia, capturada pela fotógrafa Maíra Erlich, foi destacada entre as 25 melhores fotografias do ano pela National Geographic, quase uma década após o início do colapso que assola esta comunidade nordestina.
Um retrato da força da natureza e da vulnerabilidade humana
No cerne dessa história dramática está Damião Carlos da Silva, um pescador que viveu por mais de 20 anos em sua casa ao lado da Lagoa Mundaú. Vestindo uma camisa verde e com seu passarinho de estimação em um dos braços, Damião personifica a luta e a resistência frente à adversidade. A imagem, repleta de ternura, contrasta com a crueza da situação enfrentada pelos moradores de Pinheiro, Bom Parto, Mutange, Bebedouro e parte do Farol, onde o solo tem se afundado, levando à evacuação forçada de seus habitantes.
Causas do colapso: extração de sal-gema e suas consequências
O início dessa tragédia ocorreu em março de 2018, quando os primeiros tremores de terra foram sentidos em Pinheiro. A análise do Serviço Geológico do Brasil revelou que as atividades de extração de sal-gema realizadas pela companhia petroquímica Braskem foram a causa principal do problema. A empresa foi obrigada a interromper suas operações e a indenizar os moradores, mas muitos deles consideram as compensações inadequadas em relação à gravidade da situação, que inclui não apenas danos materiais, mas também impactos psicológicos profundos.
As indenizações, frequentemente contestadas, não têm sido suficientes para cobrir o sofrimento das vítimas, muitas das quais enfrentam problemas emocionais severos, como depressão e ansiedade. Fechamentos de instituições, como escolas e igrejas, também agravaram essa realocação forçada, criando um vazio nos laços comunitários que foram desenvolvidos ao longo de décadas.
Impactos sociais e emocionais
Com o fechamento de três igrejas e a desativação de diversas instituições, os moradores enfrentam não apenas o deslocamento físico, mas também uma perda significativa de identidade e pertencimento. Damião, que inicialmente se recusou a deixar seus animais de estimação, representa uma população que luta para manter suas tradições e hábitos em meio ao caos.
Os relatos dos moradores, capturados nas visitas da fotógrafa Maíra Erlich, revelam não só a tristeza da perda de seus lares, mas também o sofrimento emocional decorrente do deslocamento forçado. A ansiedade e a insegurança permeiam a vida daqueles que ainda permanecem nas comunidades afetadas, à medida que assistem ao declínio de suas vizinhanças e à constante demolição de suas casas.
Resiliência e mobilização da comunidade
Em resposta a essa situação, a Cáritas Brasileira Regional Nordeste 2, em parceria com a Cáritas arquidiocesana de Maceió, vem desenvolvendo projetos para ajudar as comunidades afetadas a se reerguerem. Através de formações e oficinas, a Cáritas busca não apenas reparar danos materiais, mas também restaurar a dignidade e os laços comunitários perdidos ao longo dessa crise. Os esforços incluem cursos sobre reparação de danos morais e promoção do fortalecimento das lideranças locais.
Marilene Ozana Marculino da Silva, assessora técnica da Cáritas, enfatiza que, apesar das indenizações recebidas, muitas famílias continuam a vivenciar profundas interrupções em suas vidas, que vão além do espaço físico que foram forçados a deixar. As experiências de luto, desesperança e a busca por um novo começo são os desafios enfrentados pelos moradores que lutam para reconstruir suas vidas.
Um chamado à conscientização
A tragédia em Maceió nos convoca a refletir sobre a relação entre ser humano e natureza. O Papa Francisco, em sua encíclica “Laudato Si’”, destaca a responsabilidade do ser humano em cuidar e preservar o meio ambiente. As lições deste caso são claras: a proteção da Terra é uma questão de justiça social. Destruir os ecossistemas não só impacta a natureza, mas também a vida e a dignidade humana.
As vozes de Damião e dos moradores de Maceió ecoam como lembretes da luta pela justiça e dignidade em meio ao sofrimento. Que essa história inspire ação e mobilização para que tragédias como essa não se repitam, promovendo um futuro no qual o desenvolvimento e a preservação ambiental caminhem lado a lado.


