Em seu novo livro sobre a queda da bolsa de valores de 1929, o jornalista Andrew Ross Sorkin narra uma cena emblemática de um dia de verão naquele ano em Manhattan. O salão de jantar do Plaza Hotel ficou em silêncio quando figuras proeminentes de Wall Street e do mundo dos negócios começaram a chegar para o almoço de sábado. A agitação não era comum, mas a nação estava obcecada com o mercado, que estava lavando riqueza sobre investidores de todos os portes.
Entre essas personalidades, incluindo líderes respeitados de grandes bancos, havia um histórico de colaborações em esquemas de manipulação de mercado, que não eram segredo. Juntos, os grandes players formavam grupos para inflacionar o preço de ações através de “negociações fictícias”, criando a impressão de alta demanda, antes de venderem em conjunto, despencando os preços e devastando os ilusos que os seguiam.
A cultura da impunidade e suas consequências
É difícil imaginar que alguns desses homens não enfrentariam consequências por suas ações, ou ao menos vivessem com medo de exposição, mesmo que sua conduta fosse legal na época. Eles estavam bem conectados. Um deles, John J. Raskob, era o presidente do Comitê Nacional Democrata e um doador político destacado; seu maior beneficiário, o ex-governador de Nova York e candidato presidencial Al Smith, estava almoçando com ele naquele dia. Outro, William Durant, havia se encontrado secretamente com o presidente Herbert Hoover mais cedo naquele ano, pedindo que ele impedisse o Federal Reserve de conter os excessos de Wall Street.
Em seu livro 1929: Inside the Greatest Crash in Wall Street History—And How It Shattered a Nation, Sorkin menciona “paralelos notáveis” entre a preparação para aquela crise e o clima político e econômico atual, mas não aprofunda essa ideia; seu relato é essencialmente uma história linear, escrita em um registro jornalístico. No entanto, alguns paralelos reveladores emergem, refletindo mal sobre nosso caminho atual. Além da ganância e do “desta vez é diferente” que precede cada queda no mercado de ações, o colapso de 1929 parece ter sido alimentado por uma força mais insidiosa e abrangente que está, de fato, presente em todos os lugares hoje.
A captura por parte da Wall Street
Na década de 1920, como Sorkin mostra, Wall Street efetivamente obteve o que queria, enquanto Washington mantinha-se distante. Um aspecto interessante a se examinar, em vista do presente, é como o ambiente se tornou tão perigosamente favorável a Wall Street nos anos 20 — e como continuou assim mesmo com a aparição de sinais de alerta. O elemento chave, segundo a argumentação, foi o fenômeno conhecido em círculos regulatórios como “captura”: Wall Street e grandes empresas conseguiram cooptar os outros centros de poder na sociedade.
Aqueles com influência em várias esferas se coalesceram em um círculo unificado e caíram presa de um pensamento coletivo que previa riquezas para todos, sem consequências. Os organismos reguladores, o aparato político e judicial, a imprensa — quase todos os mecanismos de correção em nosso sistema estavam ou enfraquecidos ou tão alinhados com os poderosos e opulentos que não ocorreu a eles utilizar o pouco poder que ainda possuíam.
O papel da imprensa e a relação com os poderosos
Alguns críticos levantaram alarmes, como o senador Carter Glass, mas a elite bancária e seus amigos bem posicionados puderam ignorar os céticos. Apenas após a queda foi que o senador conseguiu restringir os bancos com a Lei Glass-Steagall. Financiadores organizaram ofensivas de mídia e recrutaram jornalistas como aliados, oferecendo empregos lucrativos ou subornos diretos.
A influência dos magnatas na política parece ter se intensificado, refletindo a relação do passado com figuras contemporâneas como Elon Musk, que, assim como os magnatas dos anos 20, se tornou um ator na política pública sem passar pelo trabalho de ser eleito. Durante a presidência de Joe Biden, Musk decidiu fornecer à Ucrânia e suas tropas acesso crucial ao seu serviço de internet via satélite, Starlink.
Atualmente, o cenário é alarmante. O presidente Trump angaria benefícios em setores como criptomoedas ao mesmo tempo em que promove políticas que favorecem seus negócios e ainda persegue os críticos. O recente passado mostra que, assim como em 1929, estamos diante de um sistema que parece estar em colapso, à medida que os homens da riqueza se tornam não apenas os influentes, mas também os decisores.
O desafio moral se torna cada vez mais evidente à medida que a captura e a conivência se tornam a norma. O que era impensável há décadas se torna aceitável, e a sociedade se vê diante de uma nova realidade em que os fins justificam os meios.
O legado das crises financeiras passadas deve servir como um alerta, pois a história muitas vezes se repete em ciclos. As lições de 1929 são pertinentes hoje, e os riscos que enfrentamos pedem uma reavaliação crítica de nosso sistema econômico e político.