A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu nesta terça-feira (24) que é possível retificar valores pagos por compradores que desistiram de compra de lotes não edificados, aplicando a Lei do Distrato (Lei 13.786/2018). A decisão reafirma que, mesmo na ausência de construção, há direito de deduzir taxas de ocupação e cláusulas penais na devolução.
Lei do Distrato e cláusula penal
Segundo o entendimento do STJ, a Lei do Distrato, promulgada em 2018, passou a prever expressamente a possibilidade de retenção de 10% do valor atualizado do contrato, mesmo para lotes não edificados, incluindo as taxas de fruição ou ocupação, conforme o artigo 26-A da Lei 6.766/1979. A relatora do caso, ministra Isabel Gallotti, destacou que essa legislação alterou o entendimento anterior, que considerava esses negócios como irretratáveis, com vedação de desistência.
O contrato em questão foi firmado em 2021, pelo valor de R$ 111.042. Após pagar cerca de R$ 6.549,10, o comprador resolveu desistir. A vendedora aplicou multa contratual e retenção pela taxa de ocupação, o que levou o comprador a questionar na Justiça o percentual e a legalidade das deduções. Os órgãos judiciais de primeiro grau e o TJSP entenderam que as retenções estavam de acordo com o que manda a lei e que o consumidor foi informado previamente das consequências.
Retenção de valores na rescisão: avanço legal
A ministra Gallotti explicou que, antes de 2018, a legislação brasileira, especialmente a Lei 6.766/1979, considerava esses negócios como irretratáveis e não previa cláusulas penais na rescisão. Contudo, a jurisprudência passou a reconhecer o direito do adquirente de desistir, com retenção de até 25% do valor pago, com base no Código de Defesa do Consumidor (CDC).
Com a entrada em vigor da Lei 13.786/2018, foi acrescentado o artigo 26-A na Lei 6.766/1979, estabelecendo uma cláusula penal de 10% do valor atualizado do contrato para casos de rescisão. Assim, a possibilidade de retenção, incluindo valores referentes à fruição do imóvel, ficou consolidada, independentemente de o lote ter ou não edificação.
Taxa de fruição e lotes não edificados
No que diz respeito à taxa de fruição de lotes não edificados, a jurisprudência do STJ, antes da lei, restringia sua incidência àqueles que efetivamente utilizavam o imóvel. Entretanto, a Lei do Distrato passou a permitir, no inciso I do artigo 32-A, a retenção de valores relativos à fruição até o limite de 0,75% sobre o valor atualizado do contrato, mesmo sem edificação.
De acordo com a relatora, esse entendimento é compatível com o artigo 53 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), pois o contrato não prevê perda total das quantias pagas, e o valor retido corresponde à possibilidade legal de retenção de valores pela desistência do comprador.
Perspectivas futuras
A decisão reforça o entendimento de que contratos de compra de lote, celebrados após a vigência da Lei do Distrato, podem prever a retenção de encargos, mesmo na ausência de edificação. Assim, as incorporadoras e loteadoras têm respaldo legal para aplicar tais deduções, desde que respeitando os limites estabelecidos pela legislação.
O STJ destacou ainda a importância de que as cláusulas contratuais estejam dentro do previsto na lei, garantindo segurança jurídica tanto para as empresas quanto para os consumidores.
Fonte: STJ