No Vale do Javari, uma região marcada pela intensidade de conflitos envolvendo a proteção dos direitos indígenas, surgem novas evidências sobre ameaças que se tornaram realidade. As denúncias de servidores da Funai sobre a insegurança após o assassinato de Maxciel dos Santos, em 2019, revelam um padrão de descaso institucional que levanta sérias questões sobre a responsabilidade do governo e das forças de segurança em proteger os defensores dos direitos humanos.
Contexto da situação no Vale do Javari
Localizada na tríplice fronteira entre Brasil, Colômbia e Peru, a região do Vale do Javari é o lar de várias comunidades indígenas, muitas das quais ainda vivem em isolamento. O assassinato de Maxciel foi um marco de uma onda de violência direcionada a aqueles que lutam pela proteção dos povos indígenas e do meio ambiente. De acordo com relatos de indigenistas, o clima de medo que tomou conta dos servidores da Funai agravou-se após a morte de Maxciel, levando-os a temer por suas vidas.
Em uma reunião realizada em outubro de 2019, o então presidente substituto da Funai, Alcir Amaral Teixeira, expressou dúvidas sobre a validade das denúncias feitas pelos servidores, afirmando que elas careciam de consistência para justificação de uma investigação. Essa declaração não só desconsiderou o receio manifestado pelos funcionários como também os deixou expostos a um risco ainda maior.
Reações dos servidores frente ao descaso
A indigenista Danielle Moreira Brasileiro, que atuava como coordenadora regional do Vale do Javari, compartilhou sua indignação com a postura do órgão. “Logo que Maxciel foi assassinado, todos os servidores ficaram em pânico”, recorda. Segundo ela, não houve esforços significativos por parte da Funai para proteger quem denunciava o clima de violência e as ameaças que recebia.
A sensação de insegurança se intensificou após a reunião, no qual Denise relata que Alcir, em tom de dúvida, queria ir até a base do Ituí, onde os servidores haviam sofrido ataques a tiros. Ela menciona ainda que a ausência de uma ação efetiva do governo aumentou consideravelmente o nível de insegurança entre os funcionários da Funai.
As consequências da omissão institucional
De acordo com as falas de Danielle, a falta de ação da Funai diante da violência teve consequências diretas na segurança dos servidores. Três meses após a morte de Maxciel, os depoimentos prestados ao Ministério Público Federal e à Polícia Federal não resultaram em progresso significativo nas investigações, levando a crítica de que o caso só foi reaberto devido à pressão internacional após os assassinatos de Bruno Pereira e Dom Phillips.
Um investigador chegou a afirmar: “Se naquela época as denúncias dos servidores tivessem sido levadas a sério, talvez, o destino de Bruno e Dom poderia ter sido diferente.” Essa declaração revela uma situação alarmante; a falta de credibilidade nas denúncias feitas pelos servidores da Funai expôs não apenas suas vidas, mas potencialmente também a de outras vítimas realizadas na medida que outros agentes governamentais falharam em agir.
Condenação de ex-presidente da Funai
A situação se agrava ainda mais com a recente condenação de Marcelo Xavier, ex-presidente da Funai, por pressionar servidores e lideranças indígenas em um desdobramento do clima de ameaças. Condenado a dez anos de prisão, Xavier foi acusado de denunciação caluniosa e por negligenciar aspectos fundamentais relacionados à proteção dos direitos indígenas.
O juiz responsável pela condenação enfatizou o impacto negativo da atitude de Xavier sobre as vítimas e os povos indígenas. “As vítimas, além de inocentes, não apresentavam qualquer motivação ou conduta criminosa. Sua inclusão nos procedimentos foi infundada tecnicamente, dolosa subjetivamente e instrumentalizada politicamente”, disse o juiz em sua sentença.
A luta contínua pelos direitos dos povos indígenas
A luta dos povos indígenas e dos servidores da Funai por justiça e segurança continua. A Funai, em nota, destacou seu comprometimento com a proteção dos direitos dos povos indígenas e ressaltou a importância de garantir que as vozes dos que lutam pela preservação das culturas indígenas e do meio ambiente sejam ouvidas e respeitadas.
Com a reabertura das investigações sobre o assassinato de Maxciel, espera-se que as recentes condenações inspirem uma resposta mais firme das autoridades frente à situação de violência contra defensores dos direitos humanos no Brasil. O clamor por justiça se intensifica, evidenciando a importância de um compromisso contínuo com a proteção das vidas que trabalham em prol dos povos indígenas e de um futuro mais seguro e justo.