Em meio a debates intensos sobre o papel da mulher na sociedade, Erika Kirk, esposa do assassinato do influente líder conservador Charlie Kirk, foi nomeada CEO da Turning Point USA, uma das maiores organizações de influência conservadora nos Estados Unidos. Essa transição ocorre apenas uma semana após o atentado que tirou a vida de Charlie, reforçando um discurso que mistura valores tradicionais de submissão feminina com uma atuação de liderança no mundo corporativo e político.
De esposa submissa a líder empresarial
Durante uma entrevista no programa do próprio Charlie Kirk em 2025, Erika afirmou que o papel ideal da mulher é apoiar o marido, que deve ser o responsável por “conquistar” o mundo exterior. “Seu marido tem que ser aquele que vai lá fora e conquista”, disse ela, reforçando a ideia de que companheiras devem ser a base de um “lar bíblico”.
Entretanto, após a morte do marido, ela passou a ocupar um papel que parece contrapor suas próprias mensagens: assumiu a presidência da organização, que promove valores tradicionais e conservadores. Como explicou o conselho de administração, ela foi eleita “unanimemente” para seguir a vontade de Charlie, que desejava sua liderança em caso de sua ausência.
A contradição entre discursos tradicionais e liderança moderna
Especialistas, como a professora de ciência política Shauna Shames, apontam que essa mudança revela um padrão recorrente no conservadorismo: mulheres que pregam a submissão ao mesmo tempo em que ocupam posições de poder. “Erika Kirk é uma nova encarnação de figuras como Phyllis Schlafly, que equilibraram ativismo político com mensagens de submissão doméstica”, comenta.
A interseção entre uma educação sólida e uma postura de liderança desafia a narrativa de que o conservadorismo é exclusivo de um modelo de mulher passiva. Como Schlafly, Erika também mantém uma formação acadêmica robusta — ela possui mestrado em estudos jurídicos e está cursando doutorado em estudos bíblicos — enquanto promove uma mensagem de que o trabalho fora do lar é uma maior ameaça à moral familiar.
Conservadorismo, feminismo e a ilusão de “ter tudo”
Para docentes como Shauna Shames, essa configuração reforça que muita da argumentação conservadora sobre o papel da mulher busca camuflar limitações econômicas e sociais disfarçadas de escolhas. “Mulheres que querem defender a ideia de que podem ter uma carreira e ser submissas ao mesmo tempo, enfrentam uma realidade financeira difícil se não fazem parte da elite”, explica.
Segundo pesquisas do Pew Research Center, a maioria das mães, independentemente da orientação política, trabalha fora de casa — o que evidencia que a narrativa de “ficar em casa” ainda é privilégio de poucos. Ainda assim, figuras como Erika usam essa narrativa para reforçar uma moral de que a submissão e o trabalho doméstico são opções ideais, não imposições financeiras.
O debate sobre feminismo e a resistência à mudança social
Apesar de suas declarações, a ideia de que a feminilidade tradicional está sendo extinta é contestada por especialistas. A professora Amy Binder argumenta que, na perspectiva conservadora, a mulher que atua na política ou nos negócios muitas vezes faz isso para promover valores tradicionais — uma estratégia que, na visão deles, reforça a ideia de uma “opção ideal”.
Cientes de que esses discursos polarizam a sociedade, os principais ícones conservadores continuam defendendo que o real objetivo é fortalecer a estrutura familiar tradicional, mesmo que isso signifique papel duplo para as mulheres. Como explicou Binder, “a ideia de ter tudo — uma carreira e o cuidado com o lar — é uma espécie de moda que, na verdade, favorece uma elite economicamente privilegiada”.
O impacto e o futuro dessas ideias
As palavras de Erika Kirk, ainda que controversas, alimentam o debate sobre o feminismo, a liberdade de escolha e os limites do conservadorismo moderno. Enquanto algumas figuras elogiam seu papel de liderança, outros destacam que sua trajetória expõe um paradoxo de uma ideologia que prega submissão, mas que, na prática, produz mulheres de grande influência.
Para críticos, o exemplo de Erika demonstra que o movimento conservador ainda busca reafirmar uma visão tradicional do papel da mulher, mesmo com as mudanças sociais e econômicas econômicas. Como afirmou Shames, “feminismo não será eliminado por discursos ou figuras específicas, mas sim por uma sociedade que continua a buscar igualdade de oportunidades”.
À medida que mais mulheres conservadoras ocupam posições de destaque, o debate sobre a autonomia feminina e o papel da religião na política permanece aquecido, sinalizando que esse é um ciclo que tende a persistir, com novas versões de velhas ideias.