No último dia 1º de outubro, foram divulgados os dados da Coleção 10 do MapBiomas, que revelam uma realidade alarmante sobre a perda de vegetação nativa no Cerrado. Entre os anos de 1985 e 2024, o segundo maior bioma do Brasil perdeu 40,5 milhões de hectares de sua vegetação original, ou seja, cerca de 28% da cobertura total. Essa devastação é o equivalente a uma área 1,5 vez superior ao território do estado da Bahia, o que evidencia a urgência de medidas para preservar esse bioma.
O cenário atual do Cerrado
Atualmente, aproximadamente 51,2% do Cerrado ainda apresenta vegetação nativa. O restante, que corresponde a cerca de 48%, foi convertido para a agropecuária e outras atividades de ocupação humana. O estudo apresentado pelo MapBiomas destaca uma tendência preocupante: as cidades dentro do Cerrado, que tinham mais de 80% de vegetação preservada em 1985, viram esse índice cair para apenas 16% em 2024.
Bárbara Costa, analista de pesquisa do Ipam, explica que “o Cerrado vem sendo transformado em ritmo acelerado nas últimas quatro décadas”. A supressão da vegetação nativa foi mais acentuada entre 1985 e 1995, período em que a agricultura começou a se expandir de forma significativa, transformando-se em uma das regiões centrais da produção agrícola do Brasil. Grãos como soja e milho são os principais responsáveis por essa transformação.
Impactos da Devastação
A expansão da agropecuária no Cerrado aumentou de 42% para 58% entre 1985 e 2024, resultando em que um em cada quatro municípios do bioma possua menos de 20% de vegetação nativa. Essa alteração não apenas impacta a biodiversidade local, mas também afeta comunidades que dependem da vegetação nativa para sua subsistência.
A região do Matopiba: epicentro da transformação
A região conhecida como Matopiba, formada pelos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, se destaca como o epicentro das mudanças no Cerrado. Ela representa 30% do bioma, mas acumulou 39% da perda líquida de vegetação nativa desde 1985, ou 15,7 milhões de hectares. Somente na última década, 73% de toda a devastação do Cerrado ocorreu nessa área, que viu sua agricultura aumentar em 24 vezes dentro de 40 anos. Esse crescimento resultou em um aumento de 5,5 milhões de hectares destinados a atividades agrícolas.
Novas pressões e recursos hídricos
Adicionalmente, o Cerrado enfrenta novas pressões. Um terço da área destinada a usinas fotovoltaicas do Brasil se localiza nesse bioma, com uma área total de 11,3 mil hectares em 2024 — representando um crescimento de 1.273% em comparação a 2016. Durante esse mesmo período, cerca de 4,4 mil hectares de vegetação nativa foram convertidos para esses empreendimentos.
No que diz respeito aos recursos hídricos, o Cerrado registrou em 2024 a maior superfície de água desde 1985, com 1,6 milhão de hectares. Contudo, a maior parte desse volume, 60,4%, provém de áreas artificiais, como hidrelétricas e reservatórios. As águas naturais, por outro lado, recuaram em 249 mil hectares, uma queda de 27,8%, mostrando que 90,8% das bacias hidrográficas do Cerrado perderam superfície de água natural. Essa degradação preocupa especialistas, que alertam sobre a necessidade de políticas públicas que integrem produção agrícola e conservação ambiental.
Ane Alencar, diretora de Ciência do Ipam, ressalta a importância de promover incentivos e implementar políticas que conciliem a produção agrícola com a preservação da vegetação nativa. “Só assim será possível garantir a segurança hídrica, alimentar e climática do Brasil”, conclui Alencar.
Esse relatório serve como um apelo à sociedade e aos governantes para que tomem medidas urgentes em defesa do Cerrado, um bioma essencial para a biodiversidade e a estabilidade ecológica do Brasil.