Na sua última sessão como presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Luís Roberto Barroso fez um discurso marcante, onde enfatizou o papel crucial da Corte na proteção da democracia e do Estado de Direito. O evento foi repleto de homenagens pela condução do tribunal durante o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado, uma situação sem precedentes em muitos aspectos.
Um legado de defesa constitucional
Durante seu discurso de despedida, Barroso expressou seu orgulho em ter contribuído para a defesa da Constituição Federal e da justiça em um país tão complexo como o Brasil. “Tenho muito orgulho de ter dividido com todos a aventura de defender a Constituição, a democracia e a justiça”, afirmou, em um agradecimento emocionado aos seus colegas de tribunal.
O ministro destacou o trabalho realizado pelo STF nos últimos dois anos, enfatizando que essa atuação foi vital para a preservação do Estado de Direito e a promoção dos direitos fundamentais. Ele pontuou que o modelo institucional brasileiro, apesar de suas complexidades, permitiu que o Brasil desfrutasse de 37 anos de democracia e estabilidade sob a Constituição de 1988.
Pontos de comparação histórica
Barroso continuou sua fala ressaltando que, durante sua gestão, não houve desaparecidos, torturas, ou aposentadorias compulsórias. “Todos os meios de comunicação, impressos ou digitais, manifestam-se livremente”, complementou, sublinhando a importância da liberdade de expressão em um ambiente democrático.
O decano do STF, ministro Gilmar Mendes, também fez uma homenagem à saída de Barroso, destacando a importância de sua liderança no julgamento e condenação de um ex-chefe de Estado por tentativa de golpe. Mendes caracterizou esse feito como raro, tanto a nível nacional quanto internacional. “A presidência de vossa excelência entra para a História em que pela primeira vez um ex-chefe de estado é condenado por tentativa de golpe de Estado, um fato raríssimo em termos mundiais”, afirmou.
A resistência do Supremo
Mendes, em seu discurso, enfatizou a resiliência do STF diante de ataques sem precedentes, especialmente após os eventos de 8 de janeiro, quando houve tentativas de desestabilização institucional. “Após uma nova rodada de ataques, de violência e ousadia inéditas, posso aseverar que o Supremo Tribunal Federal sobreviveu”, declarou, reforçando a importância da Corte como um pilar contra excessos políticos.
O discurso de Gilmar Mendes também destacou o estilo de liderança de Barroso: “Seu estilo elegante, sua palavra assertiva e sua condução tranquila, mesmo em meio às tormentas, serão sempre lembrados”. Este agradecimento ressoou entre os presentes, refletindo a importância do trabalho de Barroso ao longo dos últimos dois anos.
Uma carreira de destaque e compromisso
Além do reconhecimento pelos colegas de profissão, Barroso recebeu homenagens de diversas autoridades, como o procurador-geral da República, Paulo Gonet, e o advogado-geral da União, Jorge Messias. Curiosamente, alguns ministros do STF, como Luiz Fux e André Mendonça, não estiveram presentes na sessão de despedida, o que levantou questionamentos sobre a unidade do tribunal.
Nascido em Vassouras, no Rio de Janeiro, Barroso completou 12 anos no STF em junho deste ano. Durante sua trajetória, ele foi responsável por decisões significativas, como as relacionadas ao piso nacional da enfermagem, ao Fundo do Clima e a proteção dos povos indígenas contra invasões de suas terras, além de questões sociais cruciais durante a pandemia de covid-19, como o direito à moradia.
Graduado em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Barroso possui um extenso currículo acadêmico, incluindo um mestrado na Universidade de Yale e um doutorado na Uerj, assim como um pós-doutorado na Universidade de Harvard.
Reflexões sobre o futuro do STF
Com a saída de Barroso da presidência, a expectativa é que o novo presidente mantenha a integridade e a independência do Supremo, pilares que Barroso tão arduamente lutou para preservar. O futuro da Corte, assim como o da democracia brasileira, continua a depender da resistência a pressões externas e do compromisso com os direitos humanos e a justiça.
Assim, a administração de Barroso no STF é vista não apenas como um período de grandes decisões, mas também como um momento crucial na defesa da democracia brasileira, em um contexto político desafiador e muitas vezes conturbado.