Mais de80 mil pessoas no Rio de Janeiro e em São Paulo, apoiadores do governo Lula, movimentos sociais e segmentos da população insatisfeita foram às ruas ontem para manifestar sua oposição à PEC da Blindagem e à proposta de anistia para condenados envolvidos em tentativas de golpe. As mobilizações ocorreram em 25 capitais, atraíram a atenção de artistas e tiveram como alvo principal parlamentares do Centrão e aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que arquitetam as duas propostas.
A pressão sobre o Congresso aumenta
No Senado, a expectativa é que a PEC da Blindagem seja derrotada já nesta quarta-feira, conforme adiantaram o relator da proposta e o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Segundo a coluna de Bela Megale, do O GLOBO, a maioria dos senadores exprimiu contrariedade à emenda, que tem como objetivo restringir a abertura de processos criminais contra parlamentares, incluindo presidentes de partidos no rol de beneficiados.
A demonstração de força nas ruas gerou tensão entre os aliados de Bolsonaro e intensificou a pressão sobre a Câmara dos Deputados, que aprovou a PEC na semana anterior. Isso também fez o debate em torno da anistia “ampla e irrestrita”, que poderia beneficiar o ex-presidente e outros envolvidos em ataques à democracia, voltar à tona.
Mobilização histórica nas ruas
Um levantamento do Monitor do Debate Político no Meio Digital, com base em imagens aéreas, indicou que, em São Paulo, a Avenida Paulista recebeu cerca de 42,3 mil manifestantes, enquanto 41,8 mil se reuniram na praia de Copacabana no Rio de Janeiro. Esse volume de participantes foi significativamente superior aos números observados em manifestações anteriores organizadas por movimentos sociais de esquerda.
Aproximadamente 15 mil pessoas participaram do protesto de julho contra o tarifaço do governo dos EUA, enquanto os atos de ontem foram comparáveis às mobilizações bolsonaristas mais recentas, que abordaram questões semelhantes de anistia e ataques ao Judiciário. Em São Paulo, uma bandeira gigante do Brasil foi estendida na Avenida Paulista, em um contraste simbólico com a bandeira dos Estados Unidos que os apoiadores de Bolsonaro levaram nas comemorações de 7 de setembro.
Artistas se juntam à luta democrática
No Rio de Janeiro, artistas de renome como Caetano Veloso, Chico Buarque e Gilberto Gil foram os protagonistas do trio elétrico, levando música de protesto e mensagens contra a classe política ao público. O repertório incluiu clássicos que exaltam a democracia e criticam a corrupção, como “Podres poderes” e “Cálice”.
Em Brasília, Chico César também participou do evento, enquanto em Salvador, Wagner Moura e Daniela Mercury dividiram o palco. Moura não economizou nas críticas ao Congresso, afirmando que sua atuação lhe dava “preguiça”, e destacou a importância da “democracia brasileira, que é exemplo para o mundo”.
Repercussões políticas
A reação negativa à PEC da Blindagem gerou um movimento de retratação entre deputados federais, incluindo membros do PT, PSB e União Brasil, que se desculparam publicamente por terem votado a favor da proposta, que obteve 344 votos favoráveis e 133 contrários.
No dia seguinte às manifestações, a Câmara aprovou um pedido de urgência para analisar o Projeto de Lei da Anistia, com o apoio de 311 votos. O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), se tornou um alvo na manifestação, com gritos de “fora, Motta” ecoando entre os presentes na Paraíba.
A pressão sobre o Congresso aumenta à medida que os manifestantes exigem uma postura firme contra a anistia e a PEC da Blindagem, que muitos acreditam ser uma “blindagem” para a impunidade. O relator da PEC, senador Alessandro Vieira (MDB-SE), disse que recomendará a rejeição da proposta, afirmando que ela é “um absurdo e um tapa na cara da sociedade”.
Expectativas para o futuro
O projeto de anistia, que gerou controvérsias e divisões entre os parlamentares, está em fase de discussão. O relator, Paulinho da Força (Solidariedade-SP), busca um consenso, mas admitiu as dificuldades em conciliar as demandas da oposição e de governistas que desejam ajudar Bolsonaro.
No entanto, o discurso de Lula nas redes sociais enfatizou que “as manifestações demonstram que a população não quer impunidade, nem anistia”, apontando a necessidade de o Congresso se concentrar em medidas que realmente beneficiem o povo.
Com a análise da PEC marcada para esta quarta-feira, o presidente da CCJ promete que o texto será o primeiro item da pauta, com a intenção de “enterrar” a proposta, evidenciando o descompasso entre o que a população deseja e o que os legisladores estão propondo.
A luta contra a PEC da Blindagem e a anistia continua, mostrando que o povo brasileiro se mobiliza cada vez mais em defesa da democracia e da justiça.