Hoje à noite, quando o Flamengo enfrentar o Estudiantes no Maracanã pelas quartas de final da Libertadores, um grito pode ecoar nas arquibancadas: “kiricocho!” Este termo, parte de uma das mais intrigantes lendas do futebol, carrega uma superstição que promete trazer azar ao adversário durante lances decisivos, principalmente em cobranças de pênaltis. A história que envolve o “kiricocho” começou em La Plata, com o Estudiantes.
A origem da lenda do kiricocho
A lenda do “kiricocho” remonta a 1982, quando um torcedor do Estudiantes, conhecido como Kiricocho (ou Quiricocho, com variações na grafia) começou a frequentar os treinos da equipe. De acordo com a história, sempre que ele estava presente, algo de ruim acontecia aos jogadores. Não se sabe ao certo o que causou essa superstição, mas a mística rapidamente se espalhou entre os torcedores e jogadores.
Naquele ano, sob o comando do carismático técnico Carlos Bilardo, o Estudiantes não via um título nacional há 15 anos. Bilardo, reconhecendo a peculiaridade da situação, resolveu abraçar o azar supostamente trazido pelo torcedor. Ele e sua comissão técnica começaram a tocar os jogadores adversários nas costas durante as apresentações, como um ato simbólico de má sorte.
O impacto da superstição
O que aconteceu em seguida foi notável: o Estudiantes conquistou o campeonato argentino com apenas uma derrota em casa, e a história de Kiricocho se consolidou como uma mística no futebol. A combinação de fé e superstição reverberou não apenas entre as torcidas, mas também entre os jogadores, criando uma atmosfera tensa e cheia de expectativa nas partidas.
Bilardo, que depois se tornaria o técnico da seleção argentina e levaria o time ao título da Copa do Mundo em 1986, nunca perdeu o contato com a história de Kiricocho. Mesmo ao se mudar para o Sevilla, na Espanha, o grito de “kiricocho!” ecoou e foi rapidamente absorvido pela cultura local, especialmente entre os jogadores argentinos que faziam parte do clube.
A ressignificação da lenda
Seis décadas depois, em 2021, a lenda ganhou novos ares e foi evidenciada em um jogo entre Sevilla e Borussia Dortmund, quando houve uma troca de provocações entre Haaland e o goleiro Bono. Chiellini também fez referência ao “kiricocho” durante a final da Eurocopa, quando fez o grito no pênalti decisivo que resultou na vitória da Itália sobre a Inglaterra.
Mais recentemente, em 2023, o canal argentino TyC Sports decidiu investigar a fundo a origem de Kiricocho e descobriu que seu verdadeiro nome era Juan Carlos Revagliatti. De acordo com a reportagem, Revagliatti tinha uma leve deficiência cognitiva e era adotado pela comunidade do Estudiantes, especialmente entre pessoas ligadas ao futebol. Seu papel como “anotador” de apostas na época também faz parte da história que o tornou uma figura icônica no imaginário esportivo.
O legado de Kiricocho
Revagliatti, que viveu uma vida discreta e solitária, faleceu em 2019, mas seu legado permanece forte no mundo do futebol. A figura de Kiricocho tornou-se um símbolo de superstição, algo fundamental na cultura do esporte, especialmente no Brasil e na Argentina. Nas partidas, quando os torcedores gritam “kiricocho”, não celebram apenas uma superstição, mas oferecem um tributo ao poder do futebol, que vai muito além dos resultados e das estatísticas.
Com o Flamengo e o Estudiantes se preparando para um confronto emocionante, a lenda de Kiricocho irá pairar sobre o Maracanã, lembrando a todos que, no futebol, a crença e a tradição são tão relevantes quanto as habilidades em campo.