A manobra política do deputado Hugo Motta, do Republicanos-PB, para restabelecer o voto secreto na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Blindagem, vem trazendo à tona um debate acalorado na Câmara. Contrariando uma votação já realizada em plenário, Motta busca reverter decisões usando métodos já utilizados por dois de seus padrinhos políticos: Eduardo Cunha e Arthur Lira. Ambos, ex-presidentes da Câmara, eram conhecidos por saber aproveitar brechas no regimento para mudar votações desfavoráveis a seu favor.
A emenda aglutinativa e seus desdobramentos
O movimento é contestado pelas bancadas do Novo e do PSOL. Motta propõe a inclusão de uma emenda aglutinativa para resgatar aspectos do texto da PEC que foram rejeitados anteriormente. A emenda busca restabelecer a regra que exige votação secreta para deliberar sobre a autorização ou negativa de processos criminais contra parlamentares. Importante notar que essa mesma cláusula foi retirada em uma votação específica nas primeiras horas da quarta-feira.
A emenda aglutinativa é uma estratégia legítima segundo o regimento da Casa, projetada para construir consensos em meio a diversas sugestões sobre o mesmo tema. Esse instrumento tem como objetivo reunir emendas relacionadas, facilitando a criação de um texto que possa atender ao maior número de interesses possíveis.
Precedentes históricos na Câmara
Essa não é a primeira vez que a manobra é utilizada. Em julho de 2015, Eduardo Cunha se valeu desse expediente ao tentar aprovar a redução da maioridade penal. Após uma derrota com apenas cinco votos de diferença, ele reorganizou a votação no dia seguinte pela mesma emenda, obtendo 323 votos a favor, um número consideravelmente maior que o da véspera. O governo de Dilma Rousseff acusou Cunha de desrespeitar o regimento, e a questão acabou sendo levada ao Supremo Tribunal.
Seis anos depois, Arthur Lira repetiu a estratégia em setembro de 2021 ao tentar reverter uma votação sobre a quarentena de juízes e militares que queriam se candidatar. Após a derrota inicial, Lira utilizou também uma emenda aglutinativa na sua reunião com líderes do Centrão, conseguindo aprovar o dispositivo de forma ampla.
O cenário atual e as críticas
No caso de Hugo Motta, o voto secreto já havia sido rejeitado em votação separada por uma maioria de 296 votos, mas a situação foi revertida com o apoio de várias bancadas, incluindo PP, União Brasil, Republicanos, MDB, PL e PSDB. A nova votação resultou em 314 votos a favor e 168 contrários, uma clara demonstração de como a articulação política é essencial para o sucesso das manobras no legislativo.
A oposição, no entanto, não ficou calada. Lindbergh Farias, líder do PT, anunciou que o partido recorrerá ao Supremo, afirmando que a atitude de Motta fere a Constituição, que proíbe que matérias rejeitadas sejam reapresentadas na mesma sessão legislativa. Farias declarou: “Vamos, num caso como esse, recorrer ao Judiciário, porque está ferindo a Constituição.”
A aprovação da emenda que restabelece o voto secreto não se limita apenas aos processos criminais contra deputados e senadores, mas também se estende às decisões sobre a prisão em flagrante de parlamentares. Agora, a PEC segue para análise no Senado, onde o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Otto Alencar (PSD-BA), já deixou claro que acredita que a proposta não passará na Casa revisora.
Essa saga dentro da Câmara dos Deputados traz à tona a complexidade e a dinâmica do jogo político brasileiro, onde a luta pelo poder se desenrola, frequentemente, em meio a estratégias e manobras que muitas vezes despertam críticas de diferentes setores da sociedade.