Brasil, 14 de setembro de 2025
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Reação de uma acompanhante às representações de ‘Anora’: indignação e realismo

Uma acompanhante de Nova York expressa sua visão crítica sobre o filme 'Anora', destacando diferenças entre a ficção e a cotidiano da prostituição.

O filme ‘Anora’, dirigido por Sean Baker e estrelado por Mikey Madison, tem conquistado prêmios e elogios de críticos, incluindo cinco Oscars nesta cerimônia. Entretanto, as experiências e opiniões de quem trabalha na indústria do sexo trazem um olhar mais crítico e muitas vezes distante da representação hollywoodiana. Emma*, uma acompanhante e dançarina de Manhattan, compartilhou suas impressões em entrevista exclusiva, revelando a complexidade por trás da glamorização e do estereótipo apresentado na produção.

Realidade versus ficção na indústria do sexo

Emma começou destacando a autenticidade de algumas cenas iniciais do filme, que ela considera bastante próximas da rotina real de uma bailarina de clube de strip: “Quando vi o começo do filme, achei até entediante — o que provavelmente indica que era real, porque parecia que eu estava no meu trabalho”, ela afirmou. No entanto, sua percepção mudou ao longo da narrativa, especialmente ao analisar o comportamento das personagens e as situações retratadas.

Depoimentos sobre a relação com o dinheiro e dependência emocional

A acompanhante explicou que, na vida real, a relação com o dinheiro é uma prioridade, e que dependência emocional é algo que o setor evita na prática: “Ninguém aqui quer depender de alguém, e se Dependência é necessária, ela é baseada na decisão mais inteligente, com dinheiro próprio, não do pai ou de alguém assim”. Ela também criticou a narrativa do filme, ao mostrar Ani, personagem de Madison, se apaixonando e se entregando ao relacionamento com Vanya, interpretado por Vanya, sem o alerta necessário.

“No meu trabalho, ela só poderia estar cegada pelo ideal de que o homem vai realmente ficar — e a gente sabe que isso não acontece. A maioria das mulheres na indústria não acredita nisso, porque somos facilmente substituíveis e sabemos que, no fundo, tudo é sobre o dinheiro”, afirmou Emma.

Críticas às representações estereotipadas e às expectativas femininas

Ela destacou que a personagem Ani, ao manter uma postura extremamente sexualizada após o casamento, representa uma fantasia masculina — uma ideia de que a mulher do setor do sexo deve estar sempre disponível e sedutora, mesmo fora do ambiente de trabalho. “Isso é um sonho dos homens, não uma realidade das mulheres”, ela ressaltou. Emma também criticou a narrativa de que a personagem estaria ‘apaixonada’ por Vanya, indicando que essa conexão é pouco confiável, dado o perfil de dependência emocional que o setor costuma evitar.

“Muita gente acha que o filme mostra uma mulher sofrendo por amor, mas na minha experiência, a dor vem de inseguranças financeiras, de não ser levada a sério, e de tudo no mundo real que nos desrespeita”, ela explicou. Emma lamenta ainda o lado sensacionalista do filme ao retratar o sexo como uma fonte de sofrimento, uma visão que ela acredita não refletir sua vivência ou de suas colegas.

Os perigos e mal-entendidos na representação da indústria

Para Emma, o filme reforça uma narrativa perigosa: que a prostituição e o trabalho do sexo são fundamentalmente tristes e emocionalmente dolorosos. “As pessoas acreditam que essa dor seja uma parte natural de nossa experiência, mas, na verdade, metade do problema está na maneira como somos tratadas por essa sociedade”, ela disse.

Ela também comentou sobre a presença constante de homens que se veem como ‘bons’, que tentam convencer as profissionais a confiar neles ou a manter uma relação emocional. “Vemos muitos homens jovens que acham que podem se aproximar de nós como se fossem ‘bons caras’, e a expectativa deles é que a gente vá querer ficar com eles ou que se apaixone. E quando não, ficam irritados”, revelou.

Reflexões finais e o impacto da ficção

Emma acredita que o maior problema do filme é a romantização de uma rotina marcada por expectativas irreais. Ela diz que gostaria que o filme terminasse com a personagem jogando o número do Igor (Igor, personagem do filme), simbolizando a necessidade de manter alguma autonomia e distanciamento. “As pessoas lucram com um falso sonho de que a prostituição é triste e romântica, mas a realidade é que ela é muitas vezes sobre segurança e autonomia — e não sofrimento”, ela concluiu.

Questionada sobre a representação da ‘menininha ingênua’ que se apaixona, Emma reforça: “Se ela estivesse realmente no nosso mundo, saberia que esse tipo de coisa não acontece. É tudo uma fantasia, uma projeção do desejo masculino, e não a nossa realidade”.

*Nome fictício para preservar a identidade da entrevistada.

**O que diz a indústria**

Especialistas e outras profissionais do setor alertam que filmes como ‘Anora’ podem reforçar estereótipos e criar expectativas perigosas na sociedade, além de desconsiderar as múltiplas realidades de quem trabalha na indústria do sexo. Emma conclui que, enquanto a produção podem trazer visibilidade, é importante que essa visibilidade seja acompanhada de uma reflexão sobre os limites entre ficção e vida real.

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