A revelação da identidade do corpo do pianista brasileiro Francisco Tenório Cerqueira Júnior, desaparecido há 50 anos, trouxe à tona uma nova onda de emoção para sua família. Identificado pela Equipe Argentina de Antropologia Forense (EAAF), Tenório foi vítima da violência da ditadura argentina em março de 1976. O anúncio, que representa um fechamento para a família, também acende um apelo por justiça e uma nova investigação sobre o que realmente aconteceu com o músico. A seguir, exploramos os detalhes dessa história de dor, saudade e busca por respostas.
A dor da perda e o desejo de justiça
Em nota divulgada nas redes sociais, os filhos de Tenório expressaram uma “mescla de alívio e tristeza” ao receber a confirmação de que seu pai havia sido identificado. “Alívio porque, finalmente, poderemos saber com mais certeza o que lhe aconteceu naquele triste março de 1976. Tristeza pela confirmação de que Tenório foi vítima de violência e enterrado como um estranho”, afirmaram. Tenório, que tinha apenas 35 anos na época de seu desaparecimento, era um músico respeitado e deixou cinco filhos que foram criados pela mãe, enfrentando uma vida sem a figura paterna.
O caçula, Leonardo, nasceu apenas um mês após o desaparecimento de Tenório, e a dor da falta do pai ficou marcada na vida de seus filhos. A confirmação de que o corpo foi enterrado no cemitério de Benavídez, na província de Buenos Aires, sem a devida documentação, intensifica a necessidade de que mais respostas sejam dadas. “Ainda queremos e precisamos de respostas. Quem matou Tenório? Por quê?”, questionaram os filhos, ressaltando que o músico não tinha envolvimento político e vivia apenas para a música.
Mistério de cinco décadas
Tenório Júnior foi visto pela última vez em 18 de março de 1976, quando saiu de um hotel próximo à Avenida Corrientes, em Buenos Aires, para se apresentar com a famosa banda de Vinícius de Moraes e Toquinho. Dois dias depois, em 20 de março, um corpo encontrado em um terreno baldio foi confirmado como sendo do músico apenas recentemente, após uma série de exames de impressões digitais. Na época, o corpo foi examinado e enterrado sem identificação, culminando em um inquérito que não levou a respostas até agora.
Com o passar dos anos, muitos relatos e histórias sobre o desaparecimento de Tenório surgiram, mas os filhos se depararam com a realidade de que nunca teriam notícias dele. “Foi um choque descobrir que ele estava lá o tempo todo”, desabafaram os irmãos em uma nota. Eles reconhecem a importância do trabalho da EAAF e fazem um chamado para que a verdade sobre o que ocorreu com o pianista, que foi vítima de terrorismo de Estado, seja finalmente exposta.
O passado e a busca por respostas
A história de Tenório Júnior não é uma exceção. Ele faz parte de um grupo de brasileiros que desapareceram durante a repressão da Operação Condor, uma aliança entre os governos da América do Sul, incluindo Argentina, Brasil e Chile, para perseguir opositores políticos. O Movimento de Justiça e Direitos Humanos do Rio Grande do Sul estima que 11 brasileiros foram sequestrados e desapareceram em solo argentino na época. Os filhos de Tenório ressaltam a necessidade de uma nova investigação, não só pela memória de seu pai, mas em respeito a todas as vítimas do regime militar.
Um reconhecimento tardio
O Brasil reconheceu Tenório Cerqueira Júnior como desaparecido político e a Secretaria de Direitos Humanos argentina já havia admitido a responsabilidade do Estado pelo ocorrido. Em 2002, a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) concedeu indenização à família, e seu nome está gravado no monumento do Parque da Memória em Buenos Aires. Nesse sentido, a luta por justiça ainda persiste, uma vez que os filhos de Tenório cobram uma resposta contundente de quem foi responsável por sua morte, além de um reconhecimento digno de um artista que viveu apenas para a música.
Essa história ilustra não apenas a dor de uma família que lidou com a perda e a incerteza, mas também a necessidade coletiva de não deixar que tais atrocidades sejam esquecidas. O caso de Francisco Tenório Cerqueira Júnior se inscreve na luta por justiça e esclarecimento, e a expectativa é que novas investigações possam finalmente trazer as respostas que a família tanto anseia.