Pesquisadores da Universidade Metropolitana de Santos (Unimes) e do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP descobriram o que pode ser um importante sinal de alerta em relação à saúde ambiental. Bactérias super-resistentes, particularmente do tipo Escherichia coli, foram identificadas em aves silvestres no Orquidário de Santos, no litoral de São Paulo. As bactérias foram encontradas no trato intestinal de um urubu e de uma coruja, levantando questões sobre a resistência bacteriana e sua disseminação em ambientes naturais.
O fenômeno da resistência bacteriana
De acordo com o professor Fábio Sellera, que participou do estudo, a resistência a antibióticos tem sido uma preocupação crescente em ambientes hospitalares, mas agora avança para ecossistemas naturais. “Esses animais não deveriam ter contato com antibióticos na natureza”, comentou Sellera, ressaltando a anomalia da detecção de tais bactérias em aves que, teoricamente, estão distantes da influência humana.
A Escherichia coli é uma bactéria que normalmente faz parte da microbiota intestinal de humanos e animais, sendo normalmente inofensiva até certa medida. Contudo, algumas variantes dela, que são resistentes a diferentes tipos de antibióticos, representam um risco significativo à saúde pública. “Isso mostra que o problema da resistência, hoje, está muito além do ambiente hospitalar humano”, alertou o professor.
Como foi realizada a análise das aves?
A pesquisa envolveu a análise de 49 animais no Orquidário de Santos. A coleta de amostras foi realizada utilizando um swab estéril, que foi introduzido em locais específicos dos animais, como o reto, a cloaca, ou por meio de fezes. O procedimento, embora simples, é fundamental para a pesquisa microbiológica.
Durante o estudo, realizado em junho do ano passado, foi identificado que os dois pássaros estavam colonizados pelas bactérias, mas não infectados. O urubu foi trazido ao centro debilitado e com múltiplas fraturas, e acabou sendo eutanasiado. Já a coruja, que está em reabilitação há uma década, permanece assintomática, o que indica que embora portadora da bactéria, ela não apresenta sintomas da doença.
A importância de estudos como este
Sellers destacou que investigações desse tipo são raras, mas absolutamente necessárias para entender a vida selvagem e a influência das bactérias resistentes. “Deveriam ser rotina, mas atualmente ocorrem mais por interesse científico do que por uma prática institucional”, afirmou. A necessidade de um maior envolvimento institucional na pesquisa e monitoramento da fauna é um ponto que ele considera crucial para a saúde ambiental.
Contaminação e adaptação bacteriana
Um dos principais desafios do estudo é a questão da origem da contaminação. Até o momento, não há confirmação sobre como as aves foram expostas às bactérias super-resistentes. A hipótese mais levada em conta é que esses animais já viviam em ambientes em que a resistência bacteriana está disseminada.
Sellera explicou que se trata de uma adaptação das bactérias que, anteriormente restritas a humanos, agora encontram-se também em animais. “Eu começo a ter nos animais selvagens bactérias com perfil de resistência semelhante aos encontrados em ambientes hospitalares humanos”, disse o pesquisador, que, apesar das preocupações, enfatizou que não há motivo para pânico imediato.
Por fim, a pesquisa foi coautora dos alunos Bruna Garcia e Matheus Silva, com supervisão do professor Sellera e colaboração de Guilherme Paiva, do ICB da USP, sob a direção do professor Nilton Lincopan. A iniciativa, embora traga à tona um problema grave, também ilumina a importância de compreender as dinâmicas da saúde animal e ambiental no contexto atual.
É vital, portanto, que haja um esforço contínuo para monitorar e estudar a saúde das aves e outros animais silvestres, pois eles podem ser indicadores cruciais das condições de saúde pública e ambiental que nos afetam, indiretamente, diariamente.
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