Brasil, 13 de setembro de 2025
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A solidão de um torcedor vascaíno no meio da torcida adversária

Vítor, um torcedor solitário do Vasco, observa a partida em meio a botafoguenses, refletindo sobre a polarização no Brasil.

Na noite de quinta-feira, enquanto o Brasil acompanhava a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro, eu pensava na solidão de Vítor. Ele estava no Estádio Nilton Santos, na arquibancada Oeste inferior, sozinho. Desde que chegou, permaneceu em silêncio e assim continuou até sua saída. A atmosfera ao seu redor era animada, mas para ele, o jogo era uma experiência solene e introspectiva.

Vítor: o vascaíno clandestino

Vítor era um vascaíno secreto em meio a um mar de botafoguenses. Com os tíquetes da área cruzmaltina esgotados rapidamente, ele buscou uma alternativa, adquirindo um ingresso isolado para uma área do anfitrião. Essa prática, de torcer clandestinamente, não é nova — muitos praticam essa arte no velho Maracanã. Em tempos mais antigos, era comum trocar de lado com facilidade, mas agora, na era da biometria, essa manobra exige mais habilidade e disfarce.

Para Vítor, não ir ao jogo não era uma opção. Ele havia frequentado muitas vezes São Januário, enfrentando repetidas frustrações. As 777 idas e vindas que fez ao longo do tempo fortaleceram sua conexão com o Vasco, seu Vasco. E essa devoção custava lhe fé, disposição e a disciplina de um monge. Ele precisava pegar o ônibus 692, desembarcar na José dos Reis e caminhar, silencioso e vascaíno, em um oceano de camisas alvinegras. Qualquer ruído, qualquer vibração, poderia comprometer sua missão de torcer sem que ninguém perceba.

A solidão e a desconexão no futebol e na sociedade

No estádio, Vítor representava um pouco desse Brasil surdo, que não dialoga e não compartilha realidades. Em meio à torcida adversária, ele não pedia pênalti quando outros gritavam; não xingava o juiz por decisões desfavoráveis. Apenas observava. Como um petista em uma convenção do PL ou um bolsonarista em uma convenção do PT, ele era um infiltrado. Essa ressonância percebida em sua presença ilustra como o Brasil se tornou uma partida de futebol, onde as arquibancadas consomem apenas suas próprias narrativas.

A polarização no país ficou evidente quando quase metade do povo assistiu à condenação de Jair como um gol do Brasil, enquanto a outra metade viu como um gol da Alemanha. As duas metades coexistem nesse mesmo estádio, mas se afastam cada vez mais sob gritos de suas torcidas, sem qualquer chance de entendimento.

Vítor e o clima de tensão no estádio

Ali estava Vítor, torcendo em uma atmosfera isolada, mais solitário do que um Robinson Crusoé sem um rádio. Durante o primeiro tempo, ele buscou um assento próximo ao meio-campo. Quando o Vasco marcou um gol, ele se manteve em silêncio, sem celebrar. Quando o Botafogo empatou, apenas respirou. No segundo tempo, ele mudou de posição, aproximando-se do local onde a decisão da partida poderia ocorrer.

Ele era, de certa forma, o próprio Vasco da Gama, cercado de adversários e dúvidas, acreditando em jogadores pouco conhecidos e em um goleiro chamado Jardim. No momento das penalidades, a tensão aumentou. Robert Renan fez o quinto pênalti e Vítor experimentou uma redenção silenciosa. Sua celebração se limitou a um soluço e uma contração das mãos, enquanto ele partiu do estádio sem ruido, como um marinheiro esperançoso navegando em um oceano de lamentação.

A jornada de Vítor não foi apenas a de um torcedor solitário, mas a representação de um Brasil em que a comunicação e a empatia se tornaram escassas. Ao misturar forças em um campo de futebol, ele ilustra um anseio por conexão, por entendimento em meio ao ruído e à divisão que permeiam a sociedade. Uma lembrança de que, mesmo em momentos de solidão, sempre existe a possibilidade de esperança e fé no que realmente importa.

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