Um relatório recém-publicado destaca a importância central que revendedores e corretores desempenham no mercado global de spyware, enfatizando que são atores notavelmente pouco pesquisados. Segundo o documento, essas entidades atuam como intermediárias, obscurecendo as conexões entre fornecedores, vendedores e compradores. Muitas vezes, os intermediários conectam os vendedores a novos mercados regionais, gerando um cenário complexo e pouco transparente.
A complexidade da cadeia de suprimento de spyware
De acordo com Sarah Graham, coautora do relatório, essa estrutura resulta em uma cadeia de suprimento de spyware “expandida e opaca”, o que torna desafiadoras as medidas de responsabilização e o desmantelamento de estruturas corporativas e arbitragem jurisdicional. Apesar disso, Graham enfatiza que revendedores e corretores ainda não são considerados nas respostas políticas atuais relacionadas ao uso de spyware.
O estudo também revela a inclusão de três novos países associados à atividade de spyware: Japão, Malásia e Panamá. O Japão, especificamente, é signatário de iniciativas internacionais para combater o abuso de spyware, incluindo a “Declaração Conjunta sobre Esforços para Contrabalançar a Proliferação e Uso Indevido de Spyware Comercial”. A descoberta de entidades operando em novas jurisdições, como o Japão, acende um alerta sobre os potenciais conflitos de interesse entre compromissos internacionais e dinâmicas de mercado, segundo Graham.
Desafios na regulamentação do mercado de spyware
Embora a administração Biden tenha tentado regular o mercado de spyware por meio de ordens executivas e restrições comerciais, a indústria ainda opera amplamente sem restrições. Jen Roberts, do Atlantic Council, ressalta que, embora haja ações políticas robustas para combater a proliferação e o uso indevido de spyware, existe uma lacuna crítica entre essas políticas e os investidores norte-americanos — que continuam a financiar as entidades que os formuladores de políticas estão tentando combater.
Um exemplo é a Saito Tech (anteriormente Candiru), um fornecedor de spyware que está na Lista de Entidades do Departamento de Comércio dos EUA desde 2021, mas que recebeu novos investimentos da Integrity Partners em 2024. “Isso mostra que os sinais do governo dos EUA não foram suficientemente fortes para desencorajar investimentos nessa tecnologia”, afirma Roberts.
O papel dos cidadãos no financiamento do spyware
Ademais, há uma conscientização pública limitada sobre como parte do dinheiro gasto em tecnologia de spyware controversa pode, indiretamente, vir do bolso de cidadãos comuns. Relatórios de desempenho de investimento da AE Industrial Partners demonstram que a firma foi apoiada por vários fundos de pensão dos EUA, como a Associação de Aposentadoria dos Funcionários do Condado de Contra Costa e o Sistema de Aposentadoria dos Bombeiros e Policiais de Baltimore, fornecendo capital que poderia apoiar um negócio com a Paragon, que pode atingir US$ 900 milhões.
“Isso destaca a necessidade de melhor compreensão tanto do governo dos EUA quanto do público — a média dos americanos pode não entender como seus dólares estão financiando a proliferação e o uso indevido de spyware”, ressalta Roberts.
O futuro das políticas de spyware nos EUA
Atualmente, a política da administração Trump a respeito deste tema ainda não está totalmente definida. Roberts sugere uma ação mais direcionada para afetar os investimentos norte-americanos no exterior e amplia o escopo da Ordem Executiva 14105 — que já exige notificação de investimentos no exterior em tecnologias críticas como IA e semicondutores — para também abranger investimentos em spyware.
Alguns relatos indicam que a administração pode estar considerando emendas à Ordem Executiva da era Biden, que restringe o uso de spyware pelo governo. Especialmente, a manutenção dessa ordem executiva é crucial, pois utiliza o poder de compra dos EUA para proteger os cidadãos americanos contra essa tecnologia, explica Roberts.
“O poder de compra dos EUA é uma ferramenta significativa para modelar e restringir o mercado global de spyware”, conclui Roberts.
O futuro do mercado de spyware continuará a se desenrolar, e as interações entre regulamentações governamentais e dinâmicas de investimentos no setor ficarão cada vez mais complexas. Com a crescente preocupação sobre privacidade e segurança digital, é essencial que tanto os formuladores de políticas quanto o público compreendam as implicações de suas decisões financeiras neste espaço.