O cartunista Jaguar, um dos fundadores do semanário O Pasquim, morreu aos 93 anos de idade no Rio de Janeiro. A morte foi confirmada ao jornal O Globo pela viúva de Jaguar, Celia Regina Pierantoni, neste domingo, 24.
Nascido no Rio de Janeiro como Sérgio de Magalhães Gomes Jaguaribe, já dava mostras de que seria diferenciado no próprio dia do nascimento: 29 de fevereiro de 1932, um ano bissexto. Deixou a capital do País aos três anos de idade, quando seu pai, funcionário do Banco do Brasil, foi transferido para Juiz de Fora – recomendação de um pediatra para ajudar com a asma de Jaguar. Depois, o banco enviou-o para Santos, onde o jovem fez o primário e o ginásio. Por volta dos 15, pôde, enfim, voltar ao Rio.
Nos anos 1960, consagrou-se como um dos principais cartunistas da revista Senhor e colaborou também com a Revista Civilização Brasileira, a Revista da Semana, a Pif-Paf e os jornais Última Hora e Tribuna da Imprensa. Em 1968, lançou seu primeiro livro, “Átila, você é bárbaro”, um sucesso instantâneo, que, com ironia, combatia o preconceito, a ignorância e a violência. “Comparado com os vândalos de hoje, Átila não passa de um doce bárbaro”, afirmou o autor. O cronista Paulo Mendes Campos descreveu a obra como “um livro de poemas gráficos”.
Ao lado de Tarso de Castro e Sérgio Cabral, fundou o Pasquim em 1969. Irreverente e combativo, o jornal marcou a imprensa alternativa que floresceu à sombra ditadura militar e congregou alguns dos maiores expoentes do jornalismo e das artes brasileiras, como Millôr Fernandes, Ziraldo, Henfil, Paulo Francis e Sérgio Augusto.
De Zig a Gastão
Jaguar batizou o jornal e desenhou um dos símbolos mais populares do Pasquim, o ratinho sacana Sig (de Sigmund Freud), inspirado numa piada que arrancava risadas à época: “se Deus havia criado o sexo, Freud criou a sacanagem”. Neurótico e libidinoso, Zig era apaixonado por Odete Lara e Tânia Scher. Originalmente, o ratinho havia sido criado para o lançamento da cerveja Skol. Junto com Ivan Lessa, Jaguar foi incumbido de desenhar uma história para campanha publicitária e assim nasceu a tirinha “Chopnics”, mistura de “chopp” com “beatniks”, estrelada pelo Capitão Ipanema, o BD (cuja inspiração era o ator Hugo Leão de Castro, o Hugo Bidê, que tinha um ratinho branco que o acompanhava aos bares).
‘Gênio do humor’
O cartunista e roteirista Arnaldo Branco afirma que, além de ser “um gênio do humor”, “Jaguar era fera em se meter em encrenca”:
— Foi o primeiro a se manifestar contra a ditadura militar quando o jornal onde trabalhava, o Última Hora, foi destruído por golpistas (desenhou um gorila sapateando em uma máquina de escrever). Fundou O Pasquim, para falar mal dos militares e fez quase todo o staff ser preso em 1969, quando publicou uma paródia do quadro Grito do Ipiranga com Dom Pedro bradando “Eu quero mocotó!” — conta Branco. — Vai fazer falta nessa época em que humoristas sem um pingo da sua coragem nem inimigos do mesmo porte reclamam de perseguição.
Em 1970, Jaguar passou três meses encarcerado pela ditadura militar e foi solto no réveillon. Famoso por ser um dos humoristas mais escrachados do país, ele brincava que prisão “foi a fase mais feliz da minha vida”.
— Nunca bebi tanto. Não é piada: foi a fase mais feliz da minha vida. Acordava e pensava: “O que tenho para fazer hoje? Porra nenhuma!” Subornava os guardas para ter cachaça. Bebia do gargalo e jogava num matagal atrás da cela. Consegui ler 60 páginas de “Ulisses”. Depois não retomei. “Ulisses” ou você lê na prisão ou não lê.
Da Redação