No último dia 6, entrou em vigor a tarifa de 50% imposta pelo governo dos Estados Unidos sobre diversos produtos brasileiros, afetando diretamente a indústria pesqueira do Ceará, que em 2024 alcançou exportações de pescados no valor de US$ 93,8 milhões. O estado, que se destaca na produção de lagosta, atum e peixes vermelhos como pargo e guaiúba, tem 46,85% de suas exportações destinadas ao mercado americano, o que aumenta a vulnerabilidade da categoria diante do novo contexto tarifário.
Impacto do tarifaço para os pescadores cearenses
A implementação dessa taxa fez surgir preocupações profundas entre os pescadores artesanais, que representam a base da produção pesqueira cearense, sendo atualmente cerca de 32 mil profissionais. Grande parte desses pescadores vive com rendimentos mensais inferiores a R$ 1.045, lutando para sustentar suas famílias e enfrentar a concorrência no mercado.
De acordo com Caroline Feitosa, professora do Instituto de Ciências do Mar (Labomar) da Universidade Federal do Ceará, a maioria dos pescadores artesanais possui baixa escolaridade e trabalha arduamente, muitas vezes sem as ferramentas adequadas para garantir uma produção eficiente. Com 88,5% dos pescadores recebendo menos que um salário mínimo, a situação torna-se ainda mais preocupante em tempos de crise.
A cadeia produtiva e suas fragilidades
Os pescadores que operam em embarcações pequenas e simples, frequentemente pertencentes a terceiros, costumam vender sua produção a intermediários, os “marchantes”, que depois negociam com a indústria. Este modelo pode resultar em preços baixos para os pescadores, que estão em uma posição vulnerável na cadeia de comercialização.
Com o tarifaço, o receio é que a indústria pesqueira busque reduzir seus custos repassando a pressão para os pescadores. Felipe Matias, cientista-chefe da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Agrário do Ceará, destaca a possibilidade de que a demanda interna por pescado não compense as perdas causadas pela redução das exportações. Isso pode forçar os intermediários a pagarem menos, afetando ainda mais a renda dos pescadores.
Possíveis soluções e adaptação do setor
Diante do cenário desfavorável, o governo do Ceará anunciou medidas para mitigar os impactos da tarifa nos pescadores. Essas incluem a compra de produtos locais para serem integrados em programas estaduais como o Ceará Sem Fome, além de direcioná-los para escolas e hospitais. No entanto, o governador Elmano de Freitas alertou que o Estado não pagaria os preços de exportação.
A pesca artesanal no Ceará enfrenta um declínio gradual, resultante de uma superexploração de espécies e das mudanças nos ecossistemas marinhos ao longo das décadas. O engenheiro de pesca Felipe Matias observa que a pesca industrial, embora tenha sido forte no passado, foi substancialmente reduzida devido à pressão exercida sobre os estoques de peixes, levando a uma dependência maior da pesca artesanal.
Perspectivas futuras e adaptação do mercado
Apesar dos desafios, alguns especialistas veem a crise atual como uma oportunidade para o setor se diversificar e buscar novos mercados. A União Europeia, que suspendeu as importações de produtos brasileiros em 2017, poderia ser uma alternativa viável. Fortalecer outras parcerias comerciais se torna crucial para a sustentabilidade da indústria pesqueira, diluindo a dependência excessiva de um único mercado como o norte-americano.
O futuro dos pescadores cearenses ainda é incerto, mas a união e a resiliência da comunidade pesqueira, aliadas a esforços governamentais e a busca por novos horizontes de mercado, podem amenizar os efeitos do tarifaço e garantir a sobrevivência dessa importante atividade econômica e cultural no Brasil.
Com reuniões programadas entre pescadores, empresários e representantes do poder público, espera-se que a situação seja discutida de forma abrangente, buscando soluções que garantam a subsistência dos pescadores e a continuidade da atividade pesqueira no Ceará. A luta pela valorização e reconhecimento do trabalho pesqueiro continua, e a mobilização da comunidade é essencial para enfrentar os desafios impostos por políticas externas.