No último dia 4, a Associação Brasileira de ONGs (Abong) lançou uma cartilha que aborda a retomada das políticas de participação social no governo Lula. O documento, desenvolvido em parceria com a Fundação Friedrich Ebert (FES), intitulado O Papel da Sociedade Civil na Política Participativa do Governo Lula III, analisa como a participação social se insere no terceiro mandato do presidnete, especialmente após o desmonte vivido durante as gestões de Michel Temer e Jair Bolsonaro. A cartilha também aponta os desafios que a administração atual enfrenta na reconstrução dos espaços democráticos.
Importância da participação social
A pesquisa que baseou a cartilha ouviu representantes de diversas organizações da sociedade civil envolvidas em conselhos e conferências nacionais, refletindo a diversidade do campo democrático e a promoção de direitos. Uma das principais constatações é que a participação da sociedade em espaços decisórios é crucial para a efetivação da democracia no Brasil.
Entre os instrumentos de participação destacados, estão os conselhos de política pública, conferências, audiências e grupos de trabalho. Assim, a cartilha ressalta a relevância de criar e manter canais de comunicação entre o governo e a sociedade civil, permitindo que as vozes da população sejam ouvidas nas decisões que impactam o dia a dia.
“A participação não é um fim em si, mas uma estratégia para construir a possibilidade de uma democracia efetiva, que represente os interesses do conjunto da sociedade e seja um espaço de tolerância e reconhecimento”, enfatiza o documento.
De acordo com o texto, há um entendimento entre as organizações da sociedade civil de que a inclusão na participação social é um ponto central no projeto político de Lula. Isso se contrapõe à realidade vivida durante o governo Bolsonaro, que viu uma série de conselhos, como o Conselho Nacional de Segurança Alimentar (Consea), serem fechados ou perderem sua efetividade.
Desafios enfrentados
A cartilha também menciona a resistência que os espaços de participação enfrentam, com alguns conselhos tornando-se verdadeiros bastiões de resistência democrática, como o Conselho Nacional de Saúde (CNS) e o Conselho Nacional de Direitos Humanos (CDH). Apesar de seus esforços, a cartilha reconhece que é necessário ter cautela ao analisar a reabertura desses espaços.
Um dos elementos destacados é a polarização social gerada pelos discursos de ódio e ataques às instituições democráticas. O documento aponta que, embora haja uma reabertura de canais de diálogo, os impactos da extrema direita ainda são sentidos, dificultando a plena operação dos conselhos e conferências.
“Há muita resistência, por parte dos gestores públicos, em receber críticas e entender o papel da sociedade civil. Essa visão de curto prazo faz com que considerem organizações que têm postura crítica nos Conselhos como inimigos políticos”, alerta a cartilha.
As organizações da sociedade civil, por sua vez, também estão lidando com os resquícios de um governo autoritário. Muitas têm hesitado em fazer críticas mais contundentes nos fóruns nacionais, em um esforço para não desestabilizar o novo governo. Isso gera um paradoxo em que a criticidade necessária pode ser sufocada pelo medo das consequências políticas.
Caminhos para o fortalecimento democrático
A cartilha destaca a urgência de capacitar representantes da sociedade civil. Esse fortalecimento é crucial para que possam atuar de forma mais eficaz em conselhos e conferências. Além disso, a bagagem burocrática relacionada ao planejamento e gerenciamento também deve ser considerada.
“Uma estrutura de participação nas políticas públicas pressupõe a existência de organizações da sociedade civil fortalecidas e autônomas. Para atuar técnica e politicamente, são necessários recursos humanos qualificados”, indica o documento.
Além das iniciativas existentes, o documento ressalta a importância de estabelecer mecanismos de participação nos espaços de decisão da política econômica. As decisões ainda são extremamente centralizadas, e isso se revela como uma barreira significativa para a inclusão e a busca por uma democracia radicalizada no Brasil.
Por fim, a cartilha conclui que para uma transformação efetiva da sociedade e promoção da justiça social, é necessário estimular uma organização popular nas bases. Essa mobilização poderá garantir que os fóruns institucionais de participação se renovem e se alimentem dos anseios legítimos da população, criando uma agenda de radicalização democrática necessária para enfrentar as desigualdades que ainda perduram.