Brasil, 22 de dezembro de 2025
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MPF solicita R$ 5 milhões da União por ofensas à memória de João Cândido

O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou uma ação civil pública contra a União, visando o pagamento de R$ 5 milhões em reparação por dano moral coletivo. A medida se deve a manifestações oficiais da Marinha do Brasil que foram consideradas ofensivas à memória de João Cândido Felisberto, conhecido como ‘Almirante Negro’ e líder da Revolta da Chibata. Segundo o MPF, a ação não se restringe à compensação financeira, mas busca também impedir novos atos que desabonem o legado do marinheiro.

A origem da polêmica sobre João Cândido

A controvérsia teve início a partir de uma carta assinada pelo comandante da Marinha, almirante Marcos Sampaio Olsen. Na correspondência, a Revolta da Chibata é descrita como uma “deplorável página da história nacional” e um “fato opróbio”. O MPF argumenta que essas declarações denigrem não apenas a figura de João Cândido, mas também a luta dos revoltosos.

O almirante Olsen, em posteriores manifestações, se posicionou contrário à inclusão do nome de Cândido no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria, alegando que tal ato enviaria uma mensagem equivocada à corporação militar sobre o uso da força para reivindicar direitos. Ele enfatizou que as punições físicas aplicadas à época, embora reconhecidas como inaceitáveis, não devem ser exaltadas como heroísmo.

As consequências da Revolta da Chibata

João Cândido, filho de ex-escravos, e seus companheiros revoltosos tomaram a dianteira em um mutim em 1910, em resposta ao brutal tratamento e castigos físicos que frequentemente sofriam. O motim culminou na captura de quatro navios e na apontamento de 80 canhões à cidade do Rio de Janeiro, um ato que reivindicava mudanças nas condições de trabalho e o fim da repressão militar sobre os marinheiros. Após dias de conflito, o governo cedeu, abolindo as punições físicas e prometendo anistia aos rebeldes, embora muitos fossem posteriormente perseguidos.

Após a morte de João Cândido em 1969, seu legado foi reavaliado e, em 2008, ele recebeu anistia póstuma, tendo sido levantada uma estátua em sua homenagem no Centro do Rio de Janeiro. Contudo, a luta pelo reconhecimento adequado de sua trajetória ainda enfrenta barreiras.

O impacto da ação do MPF

Para o MPF, as manifestações da Marinha não apenas desrespeitam a memória de João Cândido, mas também violam a Constituição Federal e tratados internacionais ratificados pelo Brasil, além da Lei de Anistia que protege a memória dos participantes da Revolta da Chibata. O procurador adjunto dos Direitos do Cidadão no Rio de Janeiro, Julio Araujo, destacou que as declarações do comandante da Marinha configuram uma continuidade de um histórico de desrespeito à figura do marinheiro, reforçando a necessidade de reparação.

O MPF solicitou que a Justiça Federal reconheça essa responsabilidade civil da União, condenando-a a pagar os R$ 5 milhões, que devem ser direcionados a projetos que celebrem e preservem a memória de João Cândido. A ação também visa garantir que o poder público se abstenha de ofensivas futuras à sua memória.

A defesa da Marinha e a necessidade de rever a história

Embora a Marinha tenha manifestado em várias ocasiões que suas declarações refletem apenas uma perspectiva histórica, o MPF considera que essa posição demonstra a intenção de manter narrativas que não reconhecem os erros do passado. As manifestações de apoio à crueldade histórica contradizem os ideais de anistia concedidos a Cândido e a luta pela igualdade e justiça nos dias atuais.

João Cândido: um ícone da luta pelos direitos dos marinheiros

João Cândido representa não apenas a resistência contra a opressão, mas também um marco na luta por direitos civis e igualdade racial nas Forças Armadas brasileiras. Seu legado se reafirma não somente na memória daquele ato heroico, mas também nas discussões contemporâneas sobre direitos humanos e reconhecimento histórico.

Em 2024, a figura do ‘Almirante Negro’ voltou a ganhar destaque no contexto cultural brasileiro, quando foi retratada em um desfile da escola de samba Paraíso do Tuiuti, dessa forma reafirmando a importância da sua história e a busca contínua por justiça e reconhecimento de seus feitos.

O desfecho da ação civil pública e suas implicações ainda estão por vir, mas a luta pela memória de João Cândido continua na sociedade brasileira, numa sociedade que busca cada vez mais reconhecer sua história e fazer justiça a todos os seus protagonistas.

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