O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu uma liminar para suspender os efeitos de um artigo de um projeto de lei que visa cortar benefícios fiscais. Dino argumenta que o dispositivo do projeto apresenta indícios de que pode reabrir espaço para a execução de recursos do considerado “orçamento secreto”. Estima-se que o artigo permitirá o pagamento de aproximadamente R$ 1 bilhão relacionado a esse tipo de verba parlamentar, previamente declarado inconstitucional pelo STF em 2022 devido à sua falta de transparência e controle público.
Contexto do Projeto e a Suspensão Preventiva
O projeto de lei, considerado crucial para a execução do Orçamento de 2026, foi aprovado recentemente pelo Congresso e aguarda sanção presidencial. No entanto, o artigo controverso foi inserido no texto durante sua tramitação na Câmara, sendo posteriormente ratificado pelo Senado como um “jabuti”, termo utilizado para descrever dispositivos que não têm relação com o tema principal de um projeto. A questão levantada pelo ministro Dino refere-se à autorização para a revalidação de restos a pagar não processados, que foram inscritos desde 2019, incluindo valores que já haviam sido cancelados. Essa revalidação permitiria a liquidação de tais valores até o final de 2026.
O relator do caso também destacou que a proposta do artigo permitirá o pagamento de “montantes expressivos” residuais das emendas de relator (RP-9), conhecidas como orçamento secreto. Essa prática já foi repudiada pelo STF em sua decisão de 2022, o que torna a nova manobra jurídica bastante polêmica.
A Decisão Judicial e Seus Reflexos
A decisão do ministro Flávio Dino foi proferida em um mandado de segurança impetrado por quatro parlamentares de esquerda e pela Rede Sustentabilidade, que visavam barrar a possível sanção do presidente da República sobre o texto do projeto. Caso o texto seja sancionado, a liminar de Dino suspende os efeitos do artigo, que agora será submetido ao plenário do STF para deliberação em instância maior.
No julgamento do pedido, Dino enfatizou que a revalidação de restos a pagar cancelados não equivale a simples retorno a uma situação anterior, mas representa, na prática, a criação de uma nova autorização de gastos sem respaldo em uma lei orçamentária vigente. Ele argumentou que todas as tentativas de reativações de recursos devem respeitar os princípios constitucionais que governam as finanças públicas.
Envolvimento dos Três Poderes
Dino ressaltou que a revalidação de restos a pagar cancelados quebra a lógica estabelecida do sistema financeiro do Estado, infringindo o princípio da anualidade orçamentária e comprometendo a segurança jurídica. Para o ministro, tal ação tornaria imprevisível o encerramento das obrigações estatais.
“É importante sublinhar que restos a pagar regularmente cancelados deixam de existir no plano jurídico. A sua revalidação não implica o simples restabelecimento de situação pretérita, mas equivale, na prática, à criação de nova autorização de gasto, desprovida de lastro em lei orçamentária vigente”, afirmou Dino.
Implicações Finais
Ainda segundo o ministro, houve identificação de um possível vício formal de iniciativa, já que o dispositivo relacionado à execução orçamentária e gestão financeira deve ser reservado ao chefe do Poder Executivo. Além disso, Dino relembrou que existe um plano de trabalho no STF visando corrigir distorções do orçamento secreto, que não contempla a “ressuscitação” de restos a pagar, o que, segundo ele, demonstra o descompasso entre o projeto atual e os parâmetros acordados entre os poderes da República.
Com a liminar de Dino, a discussão sobre o orçamento secreto e a transparência dos gastos públicos ganha um novo fôlego, evidenciando a fragilidade das práticas orçamentárias que não respeitam os ditames constitucionais. As próximas etapas jurídicas em torno desse caso serão observadas com atenção, dado o seu potencial impacto sobre a governança fiscal no Brasil.


