A recente aprovação pelo Senado do projeto de lei de dosimetria, que propõe a redução de penas para o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros envolvidos na trama golpista de 8 de janeiro de 2023, acendeu um novo capítulo de tensões entre o governo de Luiz Inácio Lula da Silva e o Congresso. A medida, que promete impactar significativamente as condenações, já enfrenta resistência, com o presidente Lula prestes a vetá-la e líderes do Legislativo articulando esforços para tentar derrubar esse veto.
A decisão do governo e as reações no Congresso
A ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, confirmou que Lula irá vetar integralmente a medida, que já gera repercussões intensas no cenário político. Em resposta, líderes do Congresso, como o senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), afirmam que o processo legislativo de derrubada do veto será complexo e pode demorar. “Estão vendendo facilidades a algumas pessoas”, disse Randolfe, referindo-se à ideia de que a dosimetria permitiria uma rápida libertação de réus antes das festividades de fim de ano. “Isso não ocorrerá antes de julho ou agosto do ano que vem,” completou.
Enquanto isso, a oposição se movimenta. Os líderes do PT e do PSB na Câmara dos Deputados, Lindbergh Farias e Pedro Campos, respectivamente, já protocolaram uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para contestar a medida, acrescentando mais um elemento de incerteza ao cenário político.
Um acordo controverso e suas implicações
A aprovação do projeto no plenário do Senado foi impulsionada por um acordo entre os líderes, onde o senador Jaques Wagner (PT-BA) argumentou que a aprovação era inevitável. Em uma jogada estratégica, ele buscou apoio para acelerar outro projeto de lei que eleva impostos sobre apostas e fintechs, o que evidencia um jogo de interesses que pode complicar ainda mais a relação entre os poderes.
A atuação de Wagner gerou críticas, especialmente por parte de Gleisi Hoffmann, que, embora desconfortável com a abordagem, afirmou que ele permanecerá em seu cargo. Essa situação é mais uma demonstração da complexidade que envolve a política brasileira, onde acordos interpessoais frequentemente desafiam as diretrizes partidárias e institucionais.
Consequências diretas para Bolsonaro
Os cálculos sobre a redução das penas são alarmantes. Atualmente, Jair Bolsonaro enfrentaria cerca de 5 anos e 11 meses de prisão em regime fechado. Se a dosimetria for implementada, esse tempo poderia ser reduzido para aproximadamente 3 anos e 3 meses, possibilitando a progressão para um regime mais brando em 2029, conforme as estimativas preliminares. Essa redução significa que, dependendo das decisões judiciais, a prisão efetiva pode ser ainda menor — em torno de 2 anos.
A tramitação do projeto começou no início de 2024, impulsionada por iniciativas da oposição que clamavam por uma anistia ampla para os envolvidos nos ataques de 8 de janeiro. Contudo, na medida em que as discussões avançavam no STF sobre a natureza da “trama golpista”, houve uma mudança drástica na proposta original, que incluía até perdão para crimes que não estavam diretamente relacionados aos atos golpistas.
Um futuro incerto
Diante da crescente resistência dentro da estrutura política e do risco evidente de judicialização, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), transferiu a relatoria ao deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), que reformulou a proposta, substituindo a ideia da anistia por mudanças técnicas no cálculo das penas. Essa chamada dosimetria penal representa mais uma camada de complexidade ao tema, evidenciando as lutas internas e externas por controle legislativo e justiça.
Os embates entre o governo e o Congresso, somados às articulações judiciais, indicam que a batalha política em torno da dosimetria e das penas de Bolsonaro está apenas começando. Com um cenário onde as decisões podem impactar diretamente o futuro político do Brasil, a sociedade civil deve permanecer atenta e engajada nas discussões sobre justiça e responsabilização dos atos antidemocráticos.


