Laryssa tinha pouco mais de 20 anos quando seu sonho virou pesadelo. Conheceu Ramon, seu marido, na igreja aos 17 anos e se casaram com planos de um futuro juntos. Entretanto, a vida lhe impôs uma dureza inesperada. Em 2 de março de 2024, um acidente de trânsito interrompeu suas esperanças: Ramon, de 28 anos, pilotava sua moto na Rodovia Serafim Derenzi, em Vitória, Espírito Santo, quando colidiu frontalmente com um poste ao tentar desviar de um carro que invadiu a contramão. O impacto foi fatal e deixou Laryssa viúva, sem uma rede de apoio financeira ou familiar.
Após a morte do esposo, Laryssa, que estudava administração e havia perdido seu emprego, se viu sozinha para lidar com toda a burocracia funerária. Sem recursos, resolveu o traslado do corpo de Ramon para Minas Gerais, sua terra natal, e, para sobreviver, acumulou dívidas a fim de garantir o mínimo para sua subsistência.
Sem perspectiva, Laryssa pediu ajuda ao governo e acionou a Caixa Econômica Federal para solicitar a indenização de R$ 13.500 do Seguro DPVAT, um direito que deveria ter. Infelizmente, na agência, foi informada de que o pedido não poderia ser feito e que ela teria que procurar a Defensoria Pública para ter acesso ao benefício – que, à época, estava descontinuado.
“Eu era totalmente dependente do meu marido. As contas eram todas dele e quando ele morreu ficaram todas bloqueadas. Foi um período bem difícil. Se eu tivesse conseguido o DPVAT, talvez eu tivesse concluído minha faculdade”, desabafou Laryssa, revelando a solidão e a falta de estrutura que a cercavam.
Laryssa perdeu o companheiro, Ramon, em um acidente de moto no Espírito Santo em 2024.
A luta por justiça
No momento do acidente, embora o Seguro DPVAT ainda existisse juridicamente, ele estava sem regulamentação, e a Caixa alegou não ter fundos para o pagamento das indenizações. Atualmente, Laryssa faz parte de uma ação coletiva movida pela Defensoria Pública da União no Espírito Santo. O objetivo é garantir o pagamento do seguro para aqueles que tiveram seus pedidos negados nos últimos anos. Estima-se que cerca de 600 mil pessoas estejam nesta situação.
“Tenho esperança de receber esse dinheiro, pois iria me ajudar bastante. É uma forma de indenização, um direito que me foi tirado sem aviso no momento em que mais precisava. Ramon pagava o DPVAT e tudo estava em dia, mas na hora de solicitar, meu direito foi negado”, refletiu Laryssa sobre a incerteza que permeia seu cotidiano.
O que é o seguro DPVAT?
O Seguro DPVAT foi criado em 1974 para garantir indenizações às vítimas de acidentes de trânsito, seja para despesas médicas, invalidez, ou benefícios às famílias em caso de morte. O fundo era alimentado pelos proprietários de veículos no ato do licenciamento. Contudo, fraudes e desvio de recursos culminaram em investigações que revelaram a grave falta de transparência na gestão do seguro.
Embora tenha sido extinto em janeiro de 2025, o DPVAT ainda tem resquícios na luta judicial atual. A Defensoria Pública busca ressarcir as vítimas de acidentes ocorridos entre 2023 e 2024, quando, apesar da falta de regulamentação, ele ainda existia juridicamente. A ausência de regulamentação gerou um verdadeiro limbo jurídico, deixando milhares de brasileiros sem amparo.
O advogado Ernesto Tzirulnik considera que a extinção do seguro se deu de forma precipitada e irresponsável. “Quando o governo acabou com o seguro sem uma transição adequada, ele cortou a fonte de renda e deixou muitas pessoas vulneráveis”, comentou.
A perspectiva para o futuro
A Defensoria Pública aguarda a decisão da Justiça sobre a ação coletiva, e a expectativa é que ao começo do ano a situação seja analisada. A possibilidade de receber uma indenização traz um sopro de esperança para Laryssa, que continua a lutar por sua dignidade e seus direitos.
Ao encerrarmos este capítulo trágico da vida de Laryssa, sua história ilustra a fragilidade do sistema de seguros e a necessidade de melhorias nas políticas públicas para proteger as vítimas de acidentes. Apesar das adversidades, sua luta e resiliência servem como um exemplo de força diante da adversidade, e devem inspirar a sociedade a exigir um sistema de seguridade mais justo e transparente.
Arte: Gabriel Lucas/Metrópoles
A realidade enfrentada por Laryssa e muitos outros, revela a importância de um estado proativo e responsável, e da força da comunidade ao enfrentar as dificuldades e lutar por justiça.

