A agência de classificação de risco S&P rebaixou nesta semana a nota de crédito da França, de AA- para A+, citando a persistente incerteza orçamentária, mesmo após a apresentação do projeto de orçamento para 2025. A decisão surpreendeu analistas, pois o país já perdeu seu grau “duplo A” em duas das três principais agências em pouco mais de um mês, o que pode impactar fundos de investimento com critérios rigorosos.
Configuração financeira e contexto político da França
Com a mudança, a França passou a ser avaliada no quinto nível de crédito em uma escala de 21 graus, ao lado de países como Espanha e Portugal, seis degraus acima do grau especulativo. A próxima avaliação de nota está prevista para 24 de outubro, pela agência Moody’s.
Desde o início de suas atividades, diversos fatores têm contribuído para esse cenário, incluindo uma sequência de rebaixamentos feitos por Fitch e DBRS, refletindo a instabilidade política prolongada que ameaça se transformar em crise fiscal. Nos últimos anos, a Assembleia Nacional derrubou dois primeiros-ministros devido a divergências sobre planos orçamentários, aprofundando a crise.
Desafios políticos e impactos fiscais
Sébastien Lecornu, atual primeiro-ministro, conseguiu manter o cargo apenas ao ceder às demandas da oposição por gastos extras e ao suspender a reforma da Previdência de Emmanuel Macron, que buscava aumentar a idade mínima de aposentadoria de 62 para 64 anos. Além disso, abriu mão do uso do artigo 49.3 da Constituição, mecanismo que permitia aprovar leis financeiras sem votação parlamentar, aumentando a incerteza sobre a aprovação do orçamento de 2026.
O projeto inicial de Lecornu para 2025 prevê uma redução do déficit para 4,7% do PIB, frente a 5,4% neste ano. Contudo, o governo admite que há espaço para negociações, desde que o déficit não ultrapasse 5% e o país possa atingir a meta de 3% até 2029. Segundo a S&P, porém, o déficit deve cair apenas para 5,3% em 2024.
Perspectivas econômicas e instabilidade política
De acordo com a agência, a França vive sua maior instabilidade política desde a fundação da Quinta República, em 1958. Mesmo que as eleições parlamentares antecipadas resultem em maioria, não há garantia de que o governo conseguirá aprovar um plano fiscal de médio prazo ou implementar reformas econômicas essenciais.
O ministro das Finanças, Roland Lescure, reforçou o compromisso do governo em cumprir a meta de déficit de 5,4% para 2024, com a intenção de reduzi-lo a menos de 3% até 2029. Ele reconheceu que o rebaixamento da nota é um “chamado à seriedade”, e pontuou que o orçamento para 2025, que visa atingir 4,7%, ainda depende da aprovação parlamentar.
Reações e consequência no mercado
Após o rebaixamento, o risco país da França aumentou, refletido na elevação do spread dos títulos de 10 anos França-Alemanha, que superou 85 pontos-base, ante menos de 50 pontos antes das eleições antecipadas. O prêmio recuou para cerca de 78 pontos-base após Lecornu garantir a suspensão da reforma da Previdência até 2027, o que gerou impactos nos custos de endividamento do país.
O governo estima que a suspensão da reforma previdenciária custará cerca de €400 milhões em 2026 (aproximadamente R$ 2,5 bilhões) e €1,8 bilhão em 2027 (cerca de R$ 11,3 bilhões), a serem compensados por cortes de gastos, e não por aumento do déficit público. A S&P alertou que uma deterioração maior na situação fiscal ou na perspectiva de crescimento econômico poderá levar a um novo rebaixamento da nota francesa.
Reconhecendo o cenário desafiador, Lescure afirmou que a disputa para aprovar o orçamento de 2026 ainda está em andamento, e que o debate no parlamento se estenderá até o final do ano, criando incerteza sobre o caminho fiscal do país.
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