O Planalto sinalizou que medidas mais severas vêm por aí: o governo federal irá punir deputados que, apesar de controlarem cargos no Executivo, votam contra as propostas apresentadas. No último fim de semana, as demissões começaram a ocorrer, atingindo indicados do Centrão em ministeriais, autarquias e bancos federais, um gesto claro de que o governo busca livrar-se de aliados infiéis.
A justificativa das degolas
Durante a justificativa das recentes demissões, a ministra Gleisi Hoffmann foi enfática: “quem quer ficar no governo tem que votar com o governo”. A ministra comparou os aliados infiéis a visitantes que “vivem na sua casa, comem da sua comida, mas não são leais com você”, deixando claro que a tolerância acabou. A retórica deve servir para assegurar que a base de apoio presidencial se mantenha coesa nas votações, especialmente após questões delicadas como a aprovação de medidas importantes.
Uma relação complicada entre o governo e o Centrão
Desde o início do terceiro mandato de Lula, a relação entre o Planalto e o Centrão tem sido definida por uma dinâmica de “relacionamento aberto”. Os deputados fingem apoiar o governo, enquanto o governo finge acreditar nesse apoio. Durante este período, muitos deputados têm se beneficiado da máquina federal, enquanto a real lealdade permanece em questão.
Um exemplo claro dessa dinamicidade é o caso do ministro do Turismo, que, apesar de ser filiado ao União Brasil, não impediu que a maioria de seus companheiros de partido votasse com a oposição. A resistência dele em acatar ordens partidárias para deixar o governo mostra como as lealdades estão fragmentadas. Sabino chegou a apresentar uma carta de demissão, mas após uma conversa com o presidente, voltou atrás e declarou: “Continuo aqui pelo bem do turismo e da felicidade do povo do Pará”.
Fisiologismo e negociações com o Congresso
A pressão política e as demissões começaram a escancarar o fisiologismo que pautava a relação do governo com o Congresso. A ministra das Relações Institucionais tornou público que a demissão de cargos estava atrelada à derrubada de uma Medida Provisória, refletindo a troca de favores que tem caracterizado os últimos anos da política brasileira. Gleisi deixou explícito que a partilha de cargos federais segue a lógica do “toma lá, dá cá”, um reconhecimento de que a negociação política no Brasil, muitas vezes, se baseia em interesses pessoais e não necessariamente no bem comum.
Desafios futuros e estabilidade governamental
Com a base parlamentar instável, o governo agora possui o desafio de dosar o alcance das degolas. A preocupação é evitar que as demissões sejam interpretadas como um pretexto para novas traições na Câmara. O receio é que as ameaças de punição acabe caindo no descrédito, levando a um retorno à instabilidade que a gestão tenta evitar.
Até o momento, os cortes têm se limitado a cargos de segundo e terceiro escalão, o que indica uma hesitação em atingir figuras de alto escalão, talvez por medo das consequências políticas que isso traria. No entanto, o clima de incerteza permanece, pois a insatisfação entre os parlamentares pode ressoar em novas traições, dificultando ainda mais a governabilidade.
Assim, o governo Lula se vê em uma encruzilhada: restaurar a lealdade de seus aliados enquanto se navega nas complexas águas da política brasileira. Com as demissões como sinal de força, resta saber se isso será suficiente para coibir o comportamento traiçoeiro e garantir a estabilidade necessária para o avanço da agenda do governo.