Nos últimos cinco anos, muitos norte-americanos enfrentaram dificuldades econômicas. O aumento dos preços e a estagnação dos salários tornaram a compra da casa própria um sonho distante para muitos. As taxas de desemprego estão em crescimento, e as pessoas estão adiando decisões importantes de vida devido à instabilidade econômica. No entanto, para um pequeno grupo muito seleto, os últimos anos foram excepcionais.
A desigualdade em números: a realidade da acumulação de riqueza
A riqueza dos bilionários aumentou 54% apenas em 2020, coincidente com o auge da pandemia. Mesmo em meio a essa instabilidade, o mercado de ações esse crescimento beneficia apenas 10% da população, que detém incríveis 93% da riqueza do mercado. De acordo com Chuck Collins, investigador de desigualdade e autor do livro “Burned by Billionaires”, esse sistema que perpetua a desigualdade é propositalmente opaco.
Em uma entrevista, Collins explicou que “os ricos compraram seus jatos, suas mansões e agora estão comprando senadores e veículos de mídia.” Ele se preocupa com um novo capítulo de ‘hiper-extração’, onde os ricos estão se aproveitando do sistema desigual.
Os ‘vilarejos’ da riqueza
Para ilustrar o que significa ser ‘rico’ nos EUA, Collins utiliza uma ideia do jornalista Robert Frank, que categorizou a riqueza em diferentes “vilarejos”. Esses vilarejos incluem: Affluent Town (Cidade Afluente), Lower Richistan, Middle Richistan, Upper Richistan e Billionaireville. Apenas a Affluent Town possui americanos com uma renda familiar superior a $110.000.
Aos poucos, a exclusividade aumenta: Lower Richistan inclui 2,6 milhões de lares com riqueza entre $6 milhões e $13 milhões, enquanto Upper Richistan conta com residentes que possuem entre $60 milhões e $1 bilhão. Juntas, essas comunidades representam os 10% mais ricos, cerca de 14 milhões de americanos, cada um com experiências de vida bastante diferentes.
Os efeitos da desigualdade
A desigualdade não se limita apenas ao acúmulo de riquezas. Como consequência, as pessoas enfrentam maiores custos em saúde, aluguel e até mesmo nas despesas veterinárias, sem que os salários acompanhem esse aumento. Collins acredita que essa situação gera uma profunda insatisfação social.
“Os oligarcas mais poderosos entendem que muitas pessoas estão sendo deixadas para trás e sofrendo economicamente”, comenta Collins, ressaltando que partidos políticos em busca de apoio popular às vezes se aproveitam desse descontentamento, criando mensagens que dissipam a responsabilidade dos ricos sobre esses problemas.
A captura política e a defesa da riqueza
Colins detalha como a defesa da riqueza funciona em quatro etapas: geração de riqueza, defesa da riqueza, captura política e hiper-extração. A primeira etapa, de certo modo, é acessível a muitos, mas a transição para Billionaireville exige um jogo político complexo. Especialistas em defesa de riqueza, como contadores e gerentes de patrimônio, empregam táticas como fundos offshore e fundações filantrópicas para proteger suas riquezas.
Apoio político é crucial para consolidar esse poder. A decisão da Suprema Corte em 2010, Citizens United v Federal Election Commission, permitiu que ricos investissem quantias quase ilimitadas em campanhas políticas, alterando dramaticamente o equilíbrio de poder.
Poder e política: a interseção de riqueza e influência
Embora muitos visem os bilionários como o problema, Collins destaca que a verdadeira questão está nas políticas que permitem a acumulação e defesa dessa riqueza. “Não se trata dos bilionários em si, mas do sistema que permite a eles uma influência desproporcional sobre a sociedade”, afirma. Este sistema contribui para que grandes empresas controlem setores essenciais da economia, o que gera ainda mais desigualdade.
“Você pode tirar o bilionário, mas a estrutura que permitiu sua ascensão continuará a privilegiar aqueles dispostos a seguir essas regras”, conclui. Para Collins, o necessário é uma reforma no sistema económico que ajude a redistribuir riqueza e a oferecer oportunidades para todos, como altas no salário mínimo e o fortalecimento de sindicatos.
Democratas, republicanos e o papel da política na desigualdade
Nos últimos anos, colisões políticas têm bloqueado propostas favoráveis à redistribuição de riqueza. Um exemplo é o “Build Back Better” bill, uma proposta democrática votada em 2021 que pretendia financiar investimentos sociais por meio de aumentos de impostos sobre os mais ricos. A proposta, apesar de apoiada pela maioria, não avançou devido a duas vozes centristas no Senado.
Collins acredita que há espaço para mudanças através de movimentos populares, mas alerta que isso requer um esforço contínuo para se contrabalançar a influência dos ricos. “O que buscamos não é impossível; podemos consertar isso. A mudança é viável”, conclui, encorajando um despertar político para a desigualdade que afeta a vida de milhões diariamente.