Nos últimos dias, o Brasil deixou de ser uma prioridade na agenda dos Estados Unidos, devido ao foco da Casa Branca na crise orçamentária que ameaça paralisar parcialmente o governo e ao plano de paz para a Faixa de Gaza, indicado por Donald Trump. Analistas e interlocutores do governo Lula avaliam que essa situação, ainda que temporária, pode afetar os preparativos para a aguardada conversa entre o presidente norte-americano e o brasileiro, prevista para ocorrer em breve.
Foco em crise fiscal e diálogo com Israel
Segundo fontes em Brasília, a questão orçamentária dos EUA deve ser resolvida nos próximos dias, enquanto o plano de paz para Gaza pode ter desdobramentos em breve, uma vez que o grupo palestino Hamas afirmou que liberará reféns israelenses e entregará Gaza, embora queira discutir outros aspectos da proposta com Trump. A sobreposição de temas mais urgentes na agenda de Washington tem diminuído a tração da reunião entre os mandatários, que poderá acontecer por telefone, videoconferência ou durante a cúpula da ASEAN.
Redirecionamento de prioridades da política externa dos EUA
Especialistas apontam que essa mudança reflete não apenas disputas internas, mas também um redirecionamento das prioridades externas da administração de Trump. E a atenção ao Brasil diminuiu. Segundo Lucas Martins, professor de História dos Estados Unidos na Temple University, o país saiu do centro das atenções, que agora concentram-se em temas como o conflito no Oriente Médio e questões fiscais domésticas.
“O governo americano está concentrado na crise orçamentária e monitora como ela afeta as operações do Estado, inclusive com estudos sobre demissões e relocação de forças militares. Na política externa, Trump dedica atenção à proposta de paz para Gaza”, afirma Martins.
Implicações para o Brasil e avaliação do cenário
Mesmo fora do foco imediato de Washington, integrantes do governo Lula consideram que essa diminuição de atenção dos EUA não é necessariamente prejudicial. Para um interlocutor, o país deve ficar fora do radar de quem promove sanções contra cidadãos brasileiros por causa do processo contra Jair Bolsonaro no STF, alimentado por discursos de aliados de Eduardo Bolsonaro nos EUA.
O professor Dawisson Belém Lopes, da UFMG, avalia que o Brasil não é mais prioridade na agenda de Trump. “Brasília resistiu às pressões iniciais de Washington, o que indica que a Casa Branca deve usar outros instrumentos de influência”, afirma. Lopes acrescenta que, apesar disso, não há senso de urgência na relação bilateral, já que os efeitos das ações americanas são mais setoriais do que nacionais.
Principais pontos do diálogo entre Lula e Trump
Entre os assuntos que poderão fazer parte da conversa estão o tarifazo imposto pelos EUA e sanções a cidadãos brasileiros, como o ministro do STF, Alexandre de Moraes, devido ao tratamento dado a Bolsonaro. Esses temas aguardam avanços políticos em Washington para sair da estagnação, segundo analistas.
Roberto Goulart Menezes, professor da UnB, lembra que o Brasil ainda integra a “agenda negativa” com os EUA. Segundo ele, há investigações do USTR sobre práticas desleais relacionadas ao desmatamento, corrupção, tarifas elevadas no etanol, além de questões como o PIX e a Rua 25 de março, que mantém o país na mira de Washington.
Perspectivas para o relacionamento bilateral
De acordo com Menezes, embora a tão aguardada reunião entre Trump e Lula possa gerar algum impacto sobre tarifas e sanções, o Brasil ainda lida com uma agenda de conflitos com os EUA que exige cautela. Ele destaca que o governo norte-americano está focado nas possíveis consequências de uma paralisação fiscal, com planos de contingência no Pentágono para garantir operações militares e bases estratégicas.
A crise fiscal nos EUA, aliada às prioridades internacionais de Trump, levou a uma redução do protagonismo brasileiro na relação bilateral, mas o governo brasileiro acredita que essa fase passageira não trará prejuízos duradouros. O avanço nas negociações deve depender do desfecho da crise orçamentária e de possíveis moldagens políticas futuras.