A Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) aprovou, nesta terça-feira (23), um polêmico projeto que prevê a concessão de gratificações a policiais civis que “neutralizarem” criminosos em confrontos armados. O valor do adicional pode variar entre 10% e 150% do salário do policial, o que tem gerado intensos debates sobre suas implicações. Essa proposta, conhecida como “gratificação faroeste”, foi inserida como emenda a um projeto de reestruturação da Polícia Civil e agora aguarda a sanção e regulamentação pelo governo do estado.
Histórico da gratificação
A votação recente tinha como objetivo retirar a gratificação do texto, mas a tentativa foi amplamente rejeitada, com 47 votos contra apenas 15 a favor da remoção. Esse tipo de incentivo já existiu entre 1995 e 1998, quando foi extinto devido a preocupações sobre o aumento da letalidade policial, evidenciadas por denúncias de execuções durante os confrontos.
O deputado Carlos Minc utilizou dados de uma pesquisa realizada por peritos na época da gratificação anterior para justificar sua oposição à nova proposta. Segundo Minc, “64% dos mortos em combate, na época chamados de auto de resistência, eram atingidos por tiros na nuca e no ouvido, o que caracterizava execuções”. Ele relembrou que a extinção da gratificação ocorreu após essa alarmante constatação e ressaltou a ausência de melhorias na qualidade técnica da atuação policial.
Justificativas para a aprovação
Os parlamentares que apoiaram a gratificação argumentam que o bônus pode servir como um importante incentivo para as ações dos policiais e a apreensão de armamentos, contribuindo assim para o combate ao crime. O deputado Luiz Paulo pontuou que a medida foi idealizada para prestigiar divisões como a antissequestro e para melhorar o desempenho das polícias civil e militar.
Marcelo Dino, parlamentar do União Brasil, também defendeu a medida, afirmando que “nada mais é do que a valorização desses policiais”. Segundo ele, a implementação dessa gratificação pode motivar os agentes a atuarem com maior disposição. “Os nossos policiais saem de casa deixando suas famílias para proteger quem nem conhecem. Eles são verdadeiros heróis”, complementou Dino.
Críticas à medida
Por outro lado, a proposta tem gerado um clamor crescente entre especialistas em segurança pública. A criminalista Maria Fernandes, professora da FGV Direito-Rio, criticou a medida, considerando-a um retrocesso nas políticas de segurança pública do estado. “Ao invés de seguirmos em direção a iniciativas que possam efetivamente reduzir a criminalidade, estamos regredindo ao implementar uma política que apenas estimula ainda mais o homicídio e a letalidade policial”, disse Fernandes.
Ela argumenta que medidas preventivas e de fiscalização devem ser priorizadas no lugar de gratificações que podem gerar consequências graves. Para Fernandes, é necessário que as políticas públicas foquem em ações que promovam a segurança de forma a não apenas penalizar, mas também a ressocializar e trabalhar em conjunto com as comunidades afetadas pela violência.
Expectativas futuras
Com a aprovação da gratificação faroeste, as expectativas sobre a atuação da Polícia Civil no estado se intensificam. Enquanto alguns esperam que isso traga um aumento na eficiência e na efetividade das operações policiais, outros temem um aumento das arbitrariedades e dos abusos de poder, que já são questões presentes na sociedade carioca.
O próximo passo envolve a sanção do projeto pelo governador do estado, que poderá determinar normas e regulamentações para a implementação dessa política. O cenário permanece tenso, com opiniões divididas e uma população atenta ao desenrolar dos fatos, cada vez mais preocupada com a segurança pública, além da necessidade urgente de reformas que privilegiem a dignidade humana e a proteção da vida.
A discussão sobre a gratificação faroeste é, na verdade, um reflexo profundo dos dilemas enfrentados pela segurança pública no Brasil, que continuam a ser debatidos intensamente nas esferas legislativa, acadêmica e social.