Uma nova edição da pesquisa Fairwork Brasil mostra que nenhuma das principais plataformas de transporte, entrega ou serviços digitais, incluindo Uber, 99 e iFood, oferece condições básicas do chamado trabalho decente, definido pela Organização Internacional do Trabalho (OIT). O estudo, realizado por universidades brasileiras em parceria com Oxford e Berlim, avalia aspectos como remuneração, condições de trabalho, contratos, gestão e representação.
Como funciona a avaliação das plataformas de trabalho digital
De acordo com a pesquisa, as plataformas são pontuadas em cinco critérios, cada um podendo receber até dois pontos, totalizando dez. Os requisitos básicos garantem o primeiro ponto, enquanto demandas mais avançadas concedem o segundo. Nenhuma das empresas analisadas conseguiu atingir os critérios essenciais em todos os aspectos. O estudo avaliou dez plataformas em 2023, sendo que apenas duas — InDrive e Superprof — receberam alguma pontuação, ambas por apresentarem evidências de pagamento de pelo menos o salário mínimo líquido aos trabalhadores.
Baixos ganhos e jornadas exaustivas predominam no setor
Relatos coletados na pesquisa revelam jornadas excessivas, baixa remuneração e dificuldades em cobrir custos essenciais. Trabalhadores descrevem atrasos no pagamento, retenção de valores e cobrança de taxas pouco transparentes, além de alterações nos valores das corridas após sua realização. No caso do iFood, há queixas de não recebimento de gorjetas e promoções não repassadas, enquanto motoristas de apps de transporte relatam que muitos aceitam valores menores por necessidade.
Remuneração e riscos enfrentados pelos trabalhadores
Para alcançar a pontuação na categoria remuneração justa, as plataformas precisam demonstrar que seus trabalhadores não recebem ganhos abaixo do salário mínimo, após descontos ou custos. Segundo dados do Dieese, o salário ideal em julho de 2023 seria de R$ 7.274,43. No entanto, a pesquisa apontou que só duas empresas, a russa InDrive e a francesa Superprof, atingiram essa condição parcialmente, embora a baixa demanda limite os ganhos na segunda.
Baixas remunerações e falta de direitos básicos
A pesquisa evidencia que muitas plataformas deixam seus trabalhadores à própria sorte, sem respaldo em casos de furto, roubo ou acidentes, e com benefícios insuficientes ou inexistentes. Julice Salvagni, coordenadora do projeto Fairwork, afirmou: “Os resultados são alarmantes. As remunerações estão cada vez mais baixas, e as empresas se desresponsabilizam, ampliando a vulnerabilidade dos trabalhadores”.
O aumento do endividamento e o crédito facilitado
O estudo também aponta o dilema do endividamento dos trabalhadores, com muitas empresas oferecendo serviços de crédito próprios, como o Banco Didio da Uber e o iFood Pago, que já movimentou mais de R$ 1,2 bilhão. Relatos indicam que muitos motoristas recorrem a empréstimos para cobrir custos com manutenção, multas e seguros, alimentando um ciclo de dívidas.
Implicações na saúde financeira dos trabalhadores
Ao facilitar o acesso ao crédito, as plataformas estimulam a contração de dívidas para manter a atividade, muitas vezes sem garantias de estabilidade financeira. Segundo a pesquisa, essa oferta de crédito dentro da própria plataforma aumenta o risco de endividamento e vulnerabilidade dos trabalhadores.
Jornada excessiva e precarização do trabalho
A pesquisa revela ainda que as jornadas de trabalho são muitas vezes excessivas, com relatos de atrasos nos pagamentos e redução de ganhos com alterações de valores nas corridas. Muitas plataformas possuem cobrança de taxas e condições pouco esclarecidas, dificultando a compreensão dos trabalhadores sobre seus direitos e remuneração real.
Perspectivas futuras na regulação do setor
O estudo reforça a necessidade de políticas públicas que garantam direitos trabalhistas às plataformas digitais, que atualmente operam em grande medida na informalidade. Especialistas defendem uma discussão mais aprofundada sobre a regulamentação do setor para assegurar condições dignas aos milhões de trabalhadores envolvidos.
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