A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), responsável pelo julgamento da ação penal relacionada à tentativa de golpe que envolve o ex-presidente Jair Bolsonaro e militares de alta patente, demonstra um elevado grau de alinhamento em suas decisões. Desde a sua atual formação, em 2024, a turma tem mostrado uma concordância impressionante, divergindo em apenas 5% dos julgamentos em que o ministro Alexandre de Moraes atuou como relator. Essa situação revela um cenário em que a maioria das decisões tomadas pelo colegiado é unânime ou muito próxima disso, reforçando a ideia de um sistema judicial coeso em um momento de intenso escrutínio público.
Composição e decisões da Primeira Turma
O colegiado que compõe a Primeira Turma é formado, além de Moraes, por Cármen Lúcia, Luiz Fux, Flávio Dino e Cristiano Zanin. A recente entrada de Flávio Dino, em fevereiro de 2024, preencheu uma vaga deixada pela saída do ministro Luís Roberto Barroso, que assumiu a presidência do STF. Desde a nova composição, foram proferidas 501 decisões, sendo 474 delas por unanimidade. As divergências, que somam apenas 27 casos (5,3%), geralmente têm origem nas opiniões de Luiz Fux, que, embora geralmente alinhado ao restante da turma, começou a apresentar ressalvas desde a aceitação da denúncia da trama golpista em março.
Fux tem se posicionado contra a magnitude das penas propostas por Moraes para os réus envolvidos nos eventos de 8 de janeiro, defendendo sanções mais brandas. Este foi o caso da cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos, famosa por pichar a estátua em frente ao STF, onde Fux se mostrou vencido pelo argumento da maioria. Além de Fux, o único outro membro que divergiu das propostas de Moraes foi Cármen Lúcia, em um caso que envolvia a reversão da condenação do deputado federal Paulinho da Força.
Relações e afinidade entre os ministros
Além do alinhamento nas decisões, o ambiente entre os ministros da Primeira Turma é caracterizado por boas relações interpessoais. A amizade entre Dino e Moraes é um exemplo disso. Eles foram vistos juntos em um jogo de futebol que culminou na conquista de um campeonato pelo Corinthians. Este tipo de afeto pessoal parece influenciar a dinâmica da turma e seu funcionamento interno, além da formalidade dos julgamentos. No entanto, algumas desavenças recentes indicam que nem tudo é harmonia. Zanin, por exemplo, expressou insatisfação com a determinação de Dino sobre a validação de decisões judiciais estrangeiras no Brasil, uma questão delicada que envolve a aplicação da Lei Magnitsky.
Outros momentos de desentendimento incluem a imposição de medidas cautelares a Bolsonaro por Moraes, que foram contestadas por Fux sob a alegação de que restringiam direitos fundamentais de maneira desproporcional.
O protagonismo da Primeira Turma no cenário penal
A recente transformação nas regras regimentais do STF, que em 2023 transferiu a maioria das ações penais do plenário para as turmas, colocou a Primeira Turma em uma posição proeminente no julgamento de casos de alto perfil, como os eventos de 8 de janeiro. Com 1.367 ações penais atualmente na corte, 99,4% delas estão sob a análise desta turma, o que ressalta sua importância nos debates e decisões jurídicas do país.
Historicamente, a Primeira Turma tem sido considerada mais punitivista, recebendo o apelido de “câmara de gás” em contraste com a Segunda Turma, que tem uma abordagem mais garantista. A atual composição da Primeira Turma, com a saída de figuras como a ministra Rosa Weber, acentuou essa tendencia punitivista, levando muitos a observar um aumento na severidade das decisões tomadas.
Dados recentes mostram que, em 2023, a Primeira Turma avaliou mais de 5.650 pedidos de habeas corpus, concedendo apenas 101 (1,78%), enquanto a Segunda Turma concedeu decisões favoráveis em 306 dos 5.430 casos analisados (5,64%). Essa discrepância ressalta o perfil mais rigoroso da Primeira Turma na condução de processos, especialmente aqueles de repercussão política, o que tem gerado debates profundos sobre a justiça e a equidade nas sentenças proferidas.
Os próximos meses prometem ser cruciais para o desenvolvimento desses casos, especialmente com a manutenção das tensões tanto nas relações pessoais entre os ministros quanto nas suas decisões cada vez mais polarizadas. Assim, o futuro das deliberações da Primeira Turma será de grande interesse para a sociedade brasileira, especialmente com implicações diretas sobre a cultura política do país.