Um golpe doloroso desferido contra o cientista carioca Julio Davies, um experiente antropólogo que dedicou décadas de sua vida acadêmica no exterior, resultou na perda de R$ 57 mil da sua bolsa de pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Este valor refere-se a quase metade do total destinado ao seu projeto, cujo foco é o estudo das deportações de brasileiros nos Estados Unidos e as possíveis violações de seus direitos humanos. A situação provocou a suspensão temporária da pesquisa, lançando uma sombra sobre o trabalho de um profissional que retornou ao Brasil em busca de novas oportunidades.
A trajetória de Julio Davies
Julio sempre foi um defensor da ciência e da pesquisa. Após anos de trabalho na Universidade de Bristol, localizada no Reino Unido, ele decidiu voltar ao Brasil para contribuir com a ciência nacional. Em 2024, foi aprovado em um edital do CNPq que visa atrair cientistas que deixaram o país durante o fenômeno conhecido como “fuga de cérebros”. O programa, que disponibiliza R$ 500 milhões em investimentos, tinha o intuito de auxiliar pesquisadores a coordenar projetos inovadores em solo brasileiro.
O golpe
Para acessar a bolsa, Julio foi orientado a abrir uma conta e criar uma senha em uma agência do Banco do Brasil. Segundo relatos, o cartão “Visa Pesquisador” deveria ser entregue em até oito dias úteis. Porém, ele só chegou quando Julio estava participando de um congresso na Bahia. Durante o evento, recebeu um telefonema de uma mulher que se apresentou como funcionária do banco, confirmando os quatro últimos dígitos do seu cartão e solicitando que ele liberasse o uso pelo aplicativo.
“Eu não compartilhei a tela, não passei minha senha. Apenas digitei manualmente o número do cartão, sem informá-la. Não tinha chamada de vídeo, nem nada disso. Não passei nenhum dado sensível”, disse Julio, visivelmente preocupado com a situação quando percebeu a gravidade do acontecido.
As compras fraudulentas
Apenas uma hora após desbloquear o cartão, Julio descobriu que duas compras de valores exorbitantes foram realizadas em um supermercado atacadista em Bangu, na Zona Oeste do Rio de Janeiro: uma de R$ 29 mil e outra de R$ 28 mil. Ambas as transações, efetuadas presencialmente com uso de chip e senha, deixaram o pesquisador perplexo.
Ao retornar ao Rio e tentar utilizar seu cartão, Julio foi surpreendido ao saber que ele estava inoperante. Ao contestar as transações fraudulentas, o Banco do Brasil alegou que as compras eram legítimas por estarem devidamente realizadas com chip e senha. “Ou o cartão foi interceptado durante a entrega, ou foi clonado. Eu recebi um chip falso, enquanto o original foi desviado na origem”, ponderou o pesquisador.
Consequências e apurações
Além de registrar um boletim de ocorrência na Polícia Civil e na Polícia Federal, Julio expressou sua preocupação sobre as implicações da fraude em relação às suas obrigações com o CNPq. “Eu tenho que prestar contas ao CNPq sobre o uso dos recursos. Se houver uso indevido, respondo civil e criminalmente. Sem esse dinheiro, não consigo desenvolver minha pesquisa e terei que gastar do meu salário para dar continuidade ao trabalho que deveria ser financiado”, lamentou.
A situação é crítica não apenas para Julio, mas também para a integridade da pesquisa no Brasil. O Banco do Brasil, em nota, lamentou o ocorrido, ressaltando que analisa todas as contestações apresentadas individualmente e que investe continuamente em segurança digital. O CNPq assegurou que Julio não será penalizado enquanto a situação permanecer sob contestação ou enquanto houver investigação em andamento.
O que vem a seguir
A Polícia Civil começou suas diligências para apurar as circunstâncias do crime e identificar os responsáveis pela ação fraudulenta. Este caso levanta questões sobre a segurança dos sistemas bancários e regulação do uso das contas digitais, um tema que merece a atenção não apenas das instituições financeiras, mas também dos órgãos de pesquisa que dependem da confiança e segurança em suas transações financeiras.
A situação de Julio ilustra uma batalha que muitos cientistas podem enfrentar ao retornar ao Brasil e tentar recomeçar suas vidas profissionais. Sem o apoio necessário, a pesquisa científica pode sofrer um duro golpe, e a perda de recursos financeiros pode representar um retrocesso significativo em projetos importantes que têm o potencial de mudar a vida de muitas pessoas.