A recente determinação do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), de que empresas podem ser punidas por aplicar sanções contra ministros do STF, conforme o entendimento do governo dos Estados Unidos, gerou um debate entre bancos estrangeiros atuantes no Brasil. A questão central é como as instituições devem proceder diante de sanções econômicas impostas por diferentes países, principalmente quando há conflito entre o direito internacional e a entendimento da Justiça brasileira.
O dilema dos bancos diante das sanções internacionais e nacionais
De um lado, os bancos internacionais que operam no Brasil correm o risco de serem punidos nos Estados Unidos caso descumpram as sanções americanas, como ocorre na Lei Magnitsky. Por outro, seguir as determinações do Judiciário brasileiro pode provocar sanções locais, incluindo punições administrativas e multas. Como decidir entre obedecer ao comando estrangeiro ou à Justiça nacional? Essa batalha de interpretações já foi encarada por bancos em outros países, como na Bulgária, onde uma instituição se recusa a aplicar sanções Magnitsky a um político local.
No cenário brasileiro, o debate ganhou força após a decisão de Dino, que proibiu a aplicação de sanções estrangeiras não validadas por acordos internacionais ou pela Justiça brasileira. A medida cria uma “sinuca de bico” para os bancos, que precisam equilibrar o risco de sanções nos EUA, Reino Unido, Canadá e outros países com a necessidade de cumprir a legislação brasileira.
Casos internacionais e o papel da Lei Magnitsky
O que é a Lei Magnitsky?
Cria-se um paralelo com o caso suíço, envolvendo o banco UBS. A lei Magnitsky, criada nos EUA em 2012, visa punir indivíduos envolvidos em corrupção, violações de direitos humanos e lavagem de dinheiro. Ela impõe restrições como o congelamento de bens, proibição de viagens e restrições econômicas. Dados da Procuradoria suíça revelam que o esquema envolvendo suspeitos russos relacionados ao escândalo de Magnitsky resultou no congelamento de cerca de R$ 122 milhões em bancos suíços, sendo que parte foi devolvida por limitação de provas.
Na Suíça, o caso chegou à Suprema Corte, que decidiu pelo retorno do dinheiro aos russos sancionados, alegando a ausência de provas e de participação formal na acusação. A decisão foi contestada pelo fundo Hermitage Capital, ligado ao ativista Bill Browder, que liderou a campanha pela legislação Magnitsky e denuncia vulnerabilidades do sistema financeiro internacional na luta contra a corrupção.
Cedendo às sanções ou obedecendo à Justiça?
O dilema atual dos bancos suíços e de outros países é que descumprir as sanções dos EUA pode acarretar sanções financeiras ou criminais, além de prejudicar sua reputação internacional. Em contrapartida, seguir apenas a Justiça local poderia violar tratados internacionais e sanções americanas, além de abrir espaço para punições no exterior.
Segundo especialistas, até o momento, bancos suíços não divulgaram como lidaram com os fundos de cidadãos russos sancionados, o que evidencia a complexidade da questão. O banco UBS, por exemplo, ainda investiga se o dinheiro foi devolvido ou não, sem detalhes públicos.
A decisão do STF e os riscos para bancos no Brasil
Com a decisão do ministro Flávio Dino, publicada na segunda-feira (18/08), ficou clara a posição de que sanções estrangeiras não podem ser aplicadas no Brasil sem respaldo da legislação ou tratados internacionais homologados pelo país. Essa decisão, entretanto, provoca incertezas, especialmente para instituições financeiras internacionais que operam no Brasil e, potencialmente, para bancos como UBS e Credit Suisse.
Além disso, o Departamento de Estado dos EUA afirmou que “nenhum tribunal estrangeiro pode anular sanções americanas”, reforçando o conflito de jurisdições. Especialistas alertam que a decisão de Dino aumenta o risco de sanções, multas e processos contra bancos estrangeiros, além de gerar instabilidade no mercado financeiro brasileiro, refletida na queda da bolsa nas primeiras sessões após o anúncio.
Perspectivas e próximos passos
O governo brasileiro anunciou que publicará futuras normativas para regulamentar a aplicação da decisão do STF, mas o cenário permanece incerto. Trabalhar com o cumprimento ou não das sanções internacionais continuará sendo uma decisão delicada para as instituições financeiras no país, que terão de balancear os riscos de punições em diferentes jurisdições.
Enquanto isso, ativistas e investidores internacionais acompanham a disputa, que pode impactar o avanço de políticas de combate à corrupção e ao crime organizado no Brasil, além de influenciar a atuação de bancos estrangeiros na América do Sul.