Brasil, 25 de agosto de 2025
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Reação de uma trabalhadora sexual à representação de “Anora”

Recentemente, o filme “Anora”, dirigido por Sean Baker e estrelado por Mikey Madison, tem gerado debates sobre sua fidelidade à experiência real das profissionais do sexo. Apesar do reconhecimento crítico e uma recepção positiva, algumas trabalhadoras sexuais veem a produção sob uma perspectiva crítica, especialmente aquelas que atuam na noite de Manhattan. Emma*, uma acompanhante e dançarina de 25 anos, compartilhou seus pensamentos sobre a representação da indústria no filme e revelou emoções como frustração e indignação.

Acertos e distorções na narrativa de “Anora”

Emma afirmou que, na maior parte, as cenas de clube mostradas no início do filme parecem bastante realistas. “Quando assisti às primeiras cenas, fiquei entediada — o que, para mim, indica que eram fiéis à rotina de trabalho”, explicou. Ela também destacou que chegou a pensar que a história realmente retratava a vida de uma profissional do sexo, devido à recomendação de um amigo sem vínculos na indústria.

No entanto, a envolvimento emocional apresentado na personagem Ani, especialmente após o casamento, despertou sua insatisfação. Emma explicou que não acredita na narrativa de uma trabalhadora que se apaixona por um cliente novo, e criticou a idealização de uma relação que, na sua visão, seria predominantemente baseada em interesses financeiros. “Ela acha que ele realmente se apaixonaria por ela? Essa impressão é ilógica e reflete um desejo masculino de romantizar o sexo e o trabalho”, comentou.

O impacto da narrativa na percepção pública

Para Emma, uma das maiores preocupações é como o filme reforça estereótipos perigosos, especialmente com cenas que mostram Ani como uma mulher hipersexual e entregando-se a um relacionamento com Vanya de forma quase automática. Ela argumenta que essa imagem não corresponde à realidade de muitas profissionais, que precisam manter uma postura distinta entre o seu trabalho e sua vida pessoal.

“Quando ela se comporta como se fosse uma namorada apaixonada, fica claro que o filme tenta criar a fantasia de que o trabalho sexual é uma extensão de um desejo romântico, o que desconstrói a complexidade da nossa rotina”, afirmou.

Influências, expectativas e a cultura de consumo

Emma também criticou a maneira como o filme retrata a vulnerabilidade das profissionais, especialmente a ideia de que elas podem se apegar emocionalmente a clientes, o que ela considera uma visão distorcida. “Nós somos trocáveis, e o que mais nos mantém na indústria é a camaradagem com outras profissionais, a inteligência e a força que demonstramos na rotina diária”, disse.

Outro aspecto que a incomoda é a representação idealizada de homens que acreditam estar agindo com bondade ou que se consideram ‘bons rapazes’. “Muitos vêm na esperança de um relacionamento ou uma conexão emocional, mas sua expectativa é muitas vezes baseada no ilusório ‘conto de fadas’ de Hollywood, que não condiz com nossa experiência real”, revelou.

Controvérsia: dor, vulnerabilidade e a narrativa do filme

Emma também comentou sobre a forma como o filme aborda a dor e o sofrimento na vida de uma trabalhadora sexual. Ela acredita que essa abordagem reforça estereótipos que veem o trabalho sexual como uma fonte constante de sofrimento emocional ou físico, o que ela discorda. “Nós sentimos dor por questões financeiras, de não sermos levadas a sério na sociedade ou de insegurança, mas não necessariamente por sexo ou emoções”, afirmou. Ela complementou que o filme parece seguir a fantasia masculina de uma mulher sexualizada e emocionalmente frágil.

“Minha visão é que não precisamos mostrar dor para que a nossa realidade seja validada. O que realmente nos machuca é a falta de reconhecimento e de direitos”, concluiu.

Celebrando as colegas e a resistência no setor

Por fim, Emma reforçou a importância da comunidade de profissionais do sexo para sua permanência na indústria. “O que me mantém firme são as mulheres na minha rotina, inteligentes, fortes e incríveis. Elas são a verdadeira essência do que significa trabalhar nesta área”, ressaltou. Ela acredita que o filme poderia ter mostrado um retrato mais realista e respeitoso, valorizando o trabalho honesto que muitas profissionais desenvolvem diariamente.

*Nome fictício para preservar a confidencialidade

Ao esclarecer suas opiniões, Emma destacou que o retrato muitas vezes glamorizado do setor contribui para uma compreensão distorcida e, por vezes, prejudicial, da vida real das trabalhadoras sexuais, reforçando a necessidade de debates mais autênticos e empáticos sobre o assunto.

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