O Instituto Amostragem divulgou que Rafael Fonteles teria hoje 84,27% da intenção de votos no Piauí. É um número tão redondo, tão gordo, tão saboroso para o ego do governador, que parece mais receita de festa de padroeiro: exagero na medida para agradar o dono do banquete.
Para quem vive no Nordeste, acostumado a desconfiar de promessa de chuva, não é difícil também desconfiar dessas nuvens carregadas de porcentagem. Afinal, nem Jesus Cristo, que multiplicou pães e peixes, que curou cegos e ressuscitou mortos, conseguiu essa marca: só 74,4% da população mundial crê nele. Já Rafael, sem transformar água em vinho, mas transformando água em concessão privatizada, supera até o Filho de Deus no quesito “popularidade estatística”.
E o milagre, aqui, não foi dar água ao povo. Pelo contrário. Foi entregar, a preço de banana nanica, a concessão de um serviço que nem era dele — já que o abastecimento de água é prerrogativa dos municípios. Um contrato de três décadas, com sabor de herança bendita para quem o receber, e gosto amargo para o povo que paga a conta.
Se fosse verdade que 84% da população está satisfeita, então estaríamos vivendo num Piauí modelo suíço: estradas sem buraco, hospitais com médicos sobrando, escolas funcionando em tempo integral e água jorrando das torneiras. Mas como o leitor bem sabe, aqui a realidade é outra.
No Piauí, a gente sabe: quando a esmola é demais, o santo desconfia. Quando o número é demais, o eleitor devia desconfiar também. Pesquisas assim não medem popularidade. Medem a perícia de quem cozinha o resultado. E no Piauí, a cozinha da política sempre tem panela de pressão, fogo alto e tempero para agradar o freguês — desde que ele pague a conta.
Então, antes de engolir esses 84,27%, mastigue bem a informação. Porque, se a gente for acreditar piamente, o Piauí acaba de coroar não só um governador, mas um santo milagreiro da matemática eleitoral. E desses, meu amigo, a história nordestina está cheia — todos canonizados pelo marketing e esquecidos pelo povo assim que a festa acaba.