Brasil, 10 de agosto de 2025
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Reação de uma trabalhadora sexual a “Anora”: Uma perspectiva necessária

O filme “Anora”, dirigido por Sean Baker e estrelado por Mikey Madison, tem recebido aclamação crítica e indicação ao Oscar. Apesar do sucesso, a opinião de profissionais da indústria do sexo revela uma visão crítica e muitas vezes contrária à representação na ficção. Conversei com Emma*, uma acompanhante e dançarina de Manhattan, que compartilhou suas impressões e emoções ao assistir ao filme, trazendo à tona questões importantes sobre a imagem da profissão na mídia.

Realismo versus estereótipo na indústria do sexo em “Anora”

Para Emma, muitos detalhes das cenas iniciais do clube são fiéis à realidade. “Quando assisti às primeiras cenas, fiquei entediada, o que provavelmente significa que eram precisas, pois parecia comigo no trabalho”, explicou. Ela também destacou a autenticidade em relação às interações com os clientes, mas pontuou diferenças fundamentais na narrativa.

Ela comentou: “Fiquei confusa na cena em que Ani pergunta ao Vanya se ele quer fazer sexo de novo, após já terem sido pagos. No meu trabalho, nunca seguiríamos em frente assim, porque já pagaram”. A autenticidade da rotina, segundo ela, é importante, mas o roteiro tende a exagerar certos aspectos para dramatizar a história.

Representação da dependência financeira e o papel das mulheres

Emma expressou grande indignação com a cena em que as meninas comemoram o noivado de Ani, sem questionar a dependência financeira dele. “Nenhuma delas falaria assim, porque na minha experiência, as mulheres na indústria querem independência financeira. A estabilidade vem do controle que conquistamos com o próprio trabalho”, afirmou.

Ela também criticou a figura da “garota malvada” no club, dizendo que esse comportamento não sobreviveria na profissão. “O que me mantém na indústria são as colegas inteligentes e fortes, que fazem escolhas conscientes”, destacou.

Dinâmica de relacionamento e a fantasia masculina na narrativa

Ao analisar a relação de Ani com Vanya, Emma notou que a personagem do filme apresenta uma sexualidade excessivamente performática, que parece alimentada por um desejo de corresponder às expectativas masculinas. “Quando ela fica excessivamente sexual, parece uma fantasia masculina de como uma relação assim deveria ser”, explicou. Para ela, essa representação simplifica demais a complexidade das relações reais no universo do sexo pago.

Ela acrescentou: “Se ela continuasse o trabalho, isso significaria que ela depende totalmente do dinheiro, e ela não faria isso se o dinheiro não estivesse lá”. Emma também ficou incomodada ao perceber que a narrativa reforça a ideia de que a dependência emocional é algo fácil de conquistar, o que ela considera irreal e perigoso.

Reflexões finais: estereótipo, exploração e a verdadeira dor

Para Emma, o filme também perpetua uma visão sensacionalista de sofrimento na profissão, reforçando a ideia de que a dor está ligada à sexualidade, quando na verdade ela muitas vezes é consequência de instabilidade financeira ou a falta de respeito no mundo externo. “A minha dor vem de insegurança financeira ou desrespeito, não da minha sexualidade”, disse.

Ela reforçou que a representação de Ani como uma mulher emocionalmente vulnerável por fazer o seu trabalho é uma fantasia que atende aos desejos masculinos. “As meninas na indústria não precisam pagar por essa narrativa triste para serem levadas a sério ou compreendidas”, concluiu. “Somos profissionais fortes, que fazem escolhas conscientes, e não vítimas trágicas.”

A importância de vozes autênticas na discussão sobre sexo e mídia

Emma destacou que o filme mostra um lado de glamour e sofrimento, ambos inventados para um público que consome histórias tristes e dramáticas. “As pessoas lucram com esse estereótipo, criando uma narrativa que não representa a maioria de nós”, ela afirmou. A voz de profissionais como Emma é essencial para iluminar as diferenças entre ficção e realidade, promovendo uma compreensão mais justa e empática.

*Nome fictício para proteger a identidade da entrevistada.

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