Brasil, 12 de agosto de 2025
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Reação de uma trabalhador sexual à ‘Anora’: uma perspectiva que precisa ser ouvida

Uma acompanhante e dançarina de Nova York compartilha sua opinião sincera sobre o filme, destacando diferenças entre ficção e realidade na indústria.

Após o sucesso crítico e comercial do filme “Anora”, dirigido por Sean Baker e estrelado por Mikey Madison, uma trabalhadora sexual de Nova York expressa sua insatisfação e preocupação com a representação dramática e algumas cenas do filme. Ela, que trabalha há dois anos no clube de strip de Manhattan, acredita que a produção retrata uma imagem distorcida e sensível da vida de profissionais do sexo.

Perspectiva realista vs. dramatização

A acompanhante Emma*, de 25 anos, afirmou que varias cenas iniciais do filme pareciam próximas da sua experiência real. “Quando assisti ao começo, achei que era fiel à vivência no clube, o que me deixou preocupada”, disse. No entanto, ela criticou a representação de comportamento e dinâmica de dependência financeira, apontando que, na sua rotina, a independência financeira é prioridade e decisões são tomadas com inteligência.

Desacordo com a narrativa romântica

Emma ficou especialmente irritada com cenas onde as personagens comemoram um engajamento de forma superficial e sem questionar a vulnerabilidade de uma jovem em uma relação iniciada com alguém que mal conhece. “Ninguém em minha roda de colegas ia aceitar depender de um rapaz sem se preocupar com sua estabilidade, principalmente com tantos exemplos de homens que se aproveitam”, explicou. Ela acredita que a narrativa romantizada distorce a realidade do setor.

Representação da sexualidade na relação

Segundo Emma, o personagem de Vanya e o modo como a personagem Ani é retratada como eternamente “excessivamente sexual” é um clichê que reforça fantasias masculinas. “Quando passamos a conviver com alguém, essa persona de ‘hot’ constante simplesmente desaparece”, ela revela. “Se ela se mantém assim, é por questões de trabalho e dinheiro, não sentimento real.”

Ela também apontou que a mudança de Ani de uma profissional do sexo para alguém apaixonada por Vanya é artificial e prejudicial, pois a associa à entrega emocional que ela, na prática, não confia nem um pouco nos homens nesta indústria. “A personagem acaba achando que o cara se importa, o que é uma ilusão. Nós sabemos que somos substituíveis”, completou.

Críticas à visão masculina do relacionamento

Emma criticou a narrativa que sugere que uma mulher possa se apaixonar por alguém que ela conhece como cliente. “As mulheres na indústria sabem que não temos emoções verdadeiras por esses homens. Muitos entram no clube pensando que podem nos conquistar ou que estamos apaixonadas, mas é sempre uma questão de dinheiro ou jogo de interesses”, ela esclareceu.

Percepção sobre o impacto social e emocional

Ela destacou que o filme, ao mostrar uma narrativa de dor e sofrimento, reforça a ideia de que essa é a única história possível para as profissionais do setor. “Apesar de ter experiências difíceis, minha dor não vem da sexualidade, mas da insegurança financeira e de não sermos levadas a sério”, disse. Emma também atribuía essa narrativa às fantasias masculinas, que preferem figuras trágicas e emocionais para se afeiçoar.

Por fim, Emma lamentou que o filme não tenha terminado de forma mais realista, como ela gostaria, com a personagem jogando fora o telefone do personagem Igor, deixando claro que relações de dependência emocional geralmente não ocorrem neste universo.

Reconhecimento e resistência na indústria

Ela concluiu ressaltando a força das colegas de trabalho, que, apesar do cansaço, continuam na profissão por serem inteligentes e independentes. “O que me mantém na indústria são as mulheres na sala de maquiagem e no camarim, que são incríveis e muito mais fortes do que as narrativas que vemos na telona”, afirmou.

*Nome fictício para preservar a identidade da entrevistada.

Este relato reforça a necessidade de aprofundar a discussão sobre a representação do trabalho sexual no cinema, considerando as experiências reais das profissionais do setor, que muitas vezes têm uma perspectiva diferente da apresentada na ficção.

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