A recente crise societária da Eagle Football Holdings, controladora do Botafogo, ganhou contornos intrigantes e complexos. A situação se agrava com os contratos de empréstimo que sustentam o processo judicial em que a Sociedade Anônima do Futebol (SAF) do Botafogo cobra € 23 milhões (aproximadamente R$ 152 milhões) da holding. O interessante — e preocupante — é que todos os documentos foram assinados pelo mesmo indivíduo: John Textor. Ele atuou como diretor da Eagle e, simultaneamente, como officer da SAF, configurando um cenário onde o empresário emprestou recursos a si mesmo.
Os contratos de empréstimo e suas implicações
Os contratos datados de 13 de março e 29 de maio de 2024, anteriores aos títulos conquistados pelo Botafogo sob a nova gestão, fundamentam a execução do título extrajudicial que levou a Justiça do Rio de Janeiro a congelar as ações da Eagle no Brasil. Essa medida visa garantir prioridade à SAF na recuperação da quantia de € 23 milhões já vencidos, ao mesmo tempo em que mantém John Textor no comando do clube. Essa simultaneidade entre credor e devedor levanta várias questões sobre a gestão financeira e a governança do clube.
Repercussões da confusão societária
A situação é ainda mais complicada, pois evidencia a confusão que permeia a holding internacional de Textor, que também possui o Lyon, um dos principais clubes da França. Na prática, o Botafogo empréstimos à sua própria controladora para financiar compromissos internacionais do grupo. Agora, a SAF está no papel de cobrar judicialmente pagamentos que visam assegurar a saúde financeira do clube, enquanto Textor, oficialmente, se apresenta como credor e devedor ao mesmo tempo. Este cenário gera não só confusão, mas um potencial risco para a estabilidade financeira da equipe.
Decisões judiciais e riscos envolvidos
O juiz Victor Agustin Cunha Jaccoud Diz Torres, responsável pela decisão liminar que congelou as ações da Eagle, apontou o risco de inadimplência se John Textor perder o controle do grupo. Essa determinação foi crucial, pois impede que mudanças na estrutura societária da holding prejudiquem o recebimento da dívida pela SAF. Assim, a decisão não apenas protege os interesses do Botafogo, mas também ressalta a vulnerabilidade em que Textor se encontra, dado o carácter dual de sua situação.
Reflexão sobre o papel de Textor
Em última análise, a decisão que atualmente beneficia Textor é, paradoxalmente, fruto de suas próprias ações: os empréstimos que ele concedeu e recebeu, em um momento de alinhamento com os sócios da Eagle, agora servem como base para que, distanciado deles, ele possa questionar suas próprias movimentações do passado. Esse círculo vicioso revela a fragilidade do sistema e a necessidade urgente de uma análise mais profunda sobre a governança e a transparência nas operações financeiras do Botafogo e da Eagle Football Holdings.
Procurada para comentar a situação, a Eagle não se manifestou até o fechamento desta reportagem, deixando em aberto diversas dúvidas sobre os próximos passos nesse embrolho jurídico e a situação financeira do Botafogo.
A crise atual não é apenas um reflexo de uma gestão conturbada, mas uma chamada à reflexão sobre a governança que rege as entidades esportivas e o impacto que isso exerce sobre clubes e torcedores. O futuro do Botafogo agora depende não só das resoluções jurídicas, mas também de uma gestão mais clara e transparente.