Brasil, 22 de julho de 2025
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Resposta de uma acompanhante à representação de “Anora”: uma perspectiva realista e indignada

Ao acompanhar a repercussão do filme “Anora”, dirigido por Sean Baker e estrelado por Mikey Madison, uma acompanhante e dançarina de 25 anos, Emma*, expressou sua insatisfação com a narrativa que, segundo ela, perpetua estereótipos e fantasias masculinas sobre trabalho sexual. O filme, vencedor de cinco Oscars, retrata uma história de conto de fadas invertido, mas a opinião de quem vive diariamente essa realidade é bem diferente.

Representação fiel ou ilusória?

Emma destacou que várias cenas do início do filme, especialmente as que retratam o cotidiano do clube de strip, pareceram autênticas, o que inicialmente levou à esperança de uma representação verdadeira. “Quando assisti, pensei: realmente é assim na prática”, afirmou. No entanto, ela ressalta que a narrativa se perde quando apresenta Ani — a personagem principal — como excessivamente sexualizada e emocionalmente à deriva após o casamento, refletindo um estereótipo de fantasia masculina.

Contradições na narrativa

Para Emma, uma das maiores incongruências do filme é a forma como Ani é vista como alguém que, após casar, mantém uma postura altamente sexualizada. “Isso parece um desejo masculino de ver a mulher como um objeto sexual, mesmo na vida real”, explica. Ela também criticou a ideia de que a personagem estaria tão apaixonada pelo parceiro quanto pela atenção e pelo dinheiro, pois, na rotina de uma acompanhante, essa distinção é clara e muitas vezes, a dependência financeira é evitada.

Questionamentos sobre o amor e a dependência

Emma ressaltou que repudia a imagem de Ani como alguém ingenuamente apaixonada e completamente iludida pelo envolvimento com Vanya, o personagem que ela acompanha no filme. “Na nossa rotina, sabemos que somos facilmente substituíveis e não nos apaixonamos de verdade, porque isso nos coloca em vulnerabilidade”, ela afirma. Para ela, a projeção de uma mulher que acredita estar amando de verdade um homem que ela conheceu na profissão reforça a ideia de que o filme se baseia em uma fantasia masculina de amor e controle.

O impacto do filme na percepção pública

A acompanhante acredita que o filme reforça ideias perigosas, especialmente entre jovens homens que frequentam clubs, acreditando que as profissionais do sexo podem se apaixonar ou se envolver emocionalmente sem proteção. “Tem muito homem que acha que somos ‘boas’ e que podem tentar seduzir ou até nos convencer a sair do trabalho com promessas de amor ou relacionamento sério”, comenta.

Ela também criticou a imagem de “garotos bonzinhos” que os homens acreditam serem capazes de “salvar” as profissionais do sexo, reforçada por algumas cenas do filme. “Muita gente pensa que somos vítimas ou que vamos acabar apaixonadas, mas a realidade é bem diferente”, afirma Emma.

Sobre a abordagem emocional e o final do filme

Emma criticou o modo como o filme retrata o sofrimento da personagem principal como se fosse resultado de sua vida sexual, quando, na verdade, ela aponta que suas dores vêm de insegurança financeira e falta de reconhecimento. “É um desejo de manipular emocionalmente o público, de mostrar uma versão triste que alimenta a fantasia de que o trabalho sexual é uma tragédia”, ela opina.

Ela também desejaria que o filme terminasse com Ani deixando Igor — o personagem de Vanya — e se libertando, ao invés de se apegar emocionalmente a ele após o casamento.

Reconhecimento das colegas e a força do coletivo

Por fim, Emma destacou que a maior força das profissionais do sexo na sua experiência vem das amizades entre colegas. “O que me mantém na indústria são as meninas na rotina, sua inteligência e solidariedade, não os filmes ou os estereótipos criados por Hollywood”, conclui.

Reflexões finais

A discussão sobre “Anora” revela uma discrepância entre a fantasia retratada na tela e a vivência real de quem trabalha na área. Emma reforça que a narrativa muitas vezes serve mais para alimentar uma visão masculina idealizada do que para representar de forma autêntica a pluralidade de experiências de profissionais do sexo.

*Nome fictício para preservar a identidade da entrevistada.

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