A votação do projeto que flexibiliza o licenciamento ambiental, realizada ontem na Câmara dos Deputados, provocou uma intensa disputa entre os deputados Célia Xakriabá (PSOL-MG) e Kim Kataguiri (União-SP). O texto, já aprovado pela Câmara e enviado para sanção presidencial, estabelece pelo menos sete tipos de licenças ambientais que poderão ser obtidas de forma facilitada. Essa mudança, no entanto, encontrou resistência entre grupos de características governistas e ativistas ambientais, provocando um clima de tensão no plenário.
Conflito no plenário
O atrito teve início quando Kim Kataguiri fez uma ironia à deputada Célia Xakriabá, insinuando que ela estava usando um “cosplay de pavão” ao fazer uso de um cocar em sua cabeça. Antes disso, Célia havia se referido a Kim como “deputado estrangeiro”, evidenciando a crescente hostilidade entre os parlamentares. A situação se intensificou durante a fala de Célia, que, visivelmente emocionada, acabou se retirando do plenário em meio a gritos e ofensas.
O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), teve que chamar a Polícia Legislativa para restaurar a ordem e acalmar os ânimos exaltados dos deputados, que assistiam a um verdadeiro espetáculo de hostilidade. A deputada do PSOL, após ser levada por membros de sua equipe para um espaço fora do plenário, demonstrou seu estado emocional, chegando a chorar sob o apoio de seus colegas.
Entenda o que foi aprovado
O projeto de flexibilização do licenciamento ambiental foi originado em 2004, mas recebeu impulso apenas neste ano após um compromisso estabelecido entre o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), e a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), também conhecida como bancada ruralista. O texto foi revisado e aprovado pelo Senado em maio e passou por nova votação na Câmara.
O relator do projeto, deputado Zé Vitor (PL-MG), manteve uma emenda proposta pelo presidente do Senado, que institui uma “licença especial” para certos empreendimentos, mesmo que estes possam causar significativa degradação ambiental. Zé Vitor defendeu que, apesar das mudanças, não haverá alteração nas avaliações de impactos ambientais nem nas regras de licenciamento, alegando que os órgãos responsáveis continuarão exercendo suas funções.
Por sua vez, a nova Licença Ambiental Especial (LAE), concebida pela proposta, poderá facilitar a autorização para obras e exploração de recursos na Margem Equatorial, área sensível com possíveis impactos na Foz do Amazonas, onde Davi Alcolumbre tem interesses relacionados à exploração petrolífera no pré-sal.
Críticas e controvérsias
Críticos da nova legislação apontam que a facilitação das licenças pode aumentar a vulnerabilidade ambiental em várias regiões do Brasil. Além disso, a proposta elimina a necessidade de anuência do Ibama para desmatamentos na Mata Atlântica, um ponto que gerou severas críticas de ambientalistas e defensores dos direitos indígenas. De acordo com Zé Vitor, a lógica por trás dessa mudança se baseia no fato de que a maioria dos pedidos já é aceita pelo Ibama, e que os órgãos locais estão aptos a gerenciar essas demandas de maneira eficaz.
Outro ponto controverso do projeto é a eliminação do poder de lideranças indígenas e quilombolas de paralisar obras fora de áreas demarcadas, uma medida que enfrenta resistência de uma parte do governo, especialmente da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. Essa proposta tem sido vista como um golpe nas conquistas históricas das comunidades tradicionais no que diz respeito à preservação de seus direitos e territórios.
Enquanto o governo federal se prepara para a possível sanção do projeto, a tensão entre as diferentes esferas da sociedade civil, órgãos ambientais, e o próprio legislativo permanece palpável, refletindo os desafios enfrentados no Brasil contemporâneo em relação ao equilíbrio entre desenvolvimento econômico e proteção ambiental.