Na Arábia Saudita, uma monarquia teocrática onde o Islã é a religião oficial e única permitida, a liberdade religiosa é praticamente inexistente. Segundo dados da Apostolic Vicariate of Northern Arabia, há mais de um milhão de católicos vivendo no vasto território, que abrange mais de 772 milhas quadradas, quase o tamanho do México.
Igreja oculta e a resistência dos fiéis na Arábia Saudita
O bispo Aldo Berardi, responsável pela Vicariato Apostólico do Norte da Arábia desde 2023, explica que a maioria dos não-muçulmanos vive sem liberdade religiosa. “Eles não podem expressar publicamente a fé, pois há risco de punições severas, inclusive a pena de morte por apostasia”, afirma. Ainda assim, ele destaca que, apesar do contexto de repressão, a Igreja é viva e atuante, embora discretamente.
“Não podemos revelar tudo por questões de segurança, mas há uma rede de comunidades clandestinas, organizadas por idioma, rito e espiritualidade”, detalha Berardi. Segundo ele, há grupos de fiéis que se reúnem de forma reservada, entre eles católicos filipinos, indianos e de outras nacionalidades, que buscam manter sua fé ativa sem contato oficial com a Igreja.
Comunhão digital e comunidades clandestinas
O uso da internet se tornou fundamental para esses fiéis, permitindo realizar orações, formações e até missas online, sempre com extremo cuidado. “Tudo é feito com discrição, pois qualquer procedimento público é proibido. Quando há possibilidade de celebrar uma missa, ela é feita com proteção”, afirma Berardi.
Grande parte dos católicos residem em áreas rurais ou pequenas cidades, onde o acesso à religião é praticamente nulo. “A maioria vive dispersa, muitas vezes sem contato direto, mas com uma fé alimentada por pequenas comunidades informais”, acrescenta o bispo.
A Igreja na mão dos leigos
Apesar das limitações, Berardi destaca o papel fundamental dos leigos na sustentação da Igreja. “São eles que cuidam das comunidades, da catequese, das orações. É uma experiência de fé muito bonita ver essas famílias responsáveis pela própria formação espiritual”, relata.
Essa organização autônoma remonta ao período após a Revolução Iraniana de 1979, quando o governo saudita intensificou o controle religioso. “Desde então, tudo que se relaciona a presença de clero é proibido. A Igreja invisível sobrevive com a força da fé dos seus fiéis”, explica o bispo.
Desafios diplomáticos e a espera por diálogo
Embora o país não mantenha relações diplomáticas formais com o Vaticano, Berardi revela que contatos informais têm ocorrido, muitas vezes por meio de cartas diplomáticas ou interpelações de embaixadas. “Existe um desejo de diálogo, mas as tradições islâmicas dificultam qualquer aproximação oficial”, afirma.
Apesar de tudo, a Igreja continua a organizar eventos e participações em solenidades internacionais, como o Jubileu da Juventude, realizado de 28 de julho a 3 de agosto, que contará com a presença de cerca de 40 jovens de diferentes países árabes. “Estamos cuidando dessas iniciativas, mesmo com tantas restrições”, conclui Berardi.
Perspectivas de mudança e esperança no futuro
Questionado sobre o que esperar do futuro, o bispo mantém uma postura cautelosa, mas otimista. “A juventude do país, que representa cerca de 60% da população, deseja mudanças e uma maior abertura religiosa. Eles veem o que acontece no mundo e não entendem por que seu país não pode evoluir”, analisa.
Sua esperança é que, em algum momento, seja garantida a liberdade de culto, mesmo que a liberdade religiosa plena ainda seja um objetivo distante. “O que queremos é o direito de praticar nossa fé, com segurança e sem medo”, finaliza.
Esta reportagem foi publicada originalmente pela ACI Prensa e adaptada pela CNA.